Manifestações marcam abertura da Copa e, apesar de forte repressão, atos seguem

Em São Paulo, os manifestantes foram sitiados pela Polícia Militar dentro do sindicato dos Metroviários e depois forçados a dispersar sob ameaça de invasão do prédio por homens da força tática.

Não foram só os barulhos dos fogos de artifício em comemoração à abertura da Copa do Mundo que ecoaram pelo céu do país neste 12 de junho. Em diversas cidades, o que se ouviu nas ruas, antes do início do jogo foram os estrondos das bombas atiradas pela polícia para reprimir os atos, que reivindicavam mais investimentos em saúde e educação públicas, moradia e transporte dignos e reprovavam os gastos públicos excessivos com o megaevento. Na pauta também a defesa pelo livre direito de manifestação – garantido na Constituição, mas negado nas ruas.

A quinta-feira marcou, além do início do campeonato mundial de futebol, o primeiro dia de protestos da jornada “Na Copa vai ter Luta”, organizada pelos movimentos sociais, populares e sindicais que compõe o Espaço Unidade de Ação, entre os quais o ANDES-SN. Outros atos, como “Copa das Manifestações” organizado pelo Comitê Popular da Copa, também amplificaram os protestos contra os abusos cometidos em nome da realização do campeonato. O Sindicato Nacional integrou a atividade em várias cidades, através de suas seções sindicais e diretores regionais.

“Esse ato nacional foi resultado de uma construção unitária entre sindicatos, movimentos populares e movimento estudantil, tinha como princípio a experiência e o método da classe trabalhadora. O método é ir às ruas defender nossas reivindicações de forma democrática e pacífica como forma de cobrar dos governantes as mudanças que queremos para o país. Os trabalhadores questionam os gastos com a Copa do Mundo em um momento que o governo alega que não pode atender suas reivindicações por falta de recursos. Se não existem recursos para as reivindicações da classe trabalhadora, como tem dinheiro para obras da Copa do Mundo, empresas privadas e aeroportos. Diante desta contradição, a rua é o lugar para darmos visibilidade a essas insatisfações”, explicou Marinalva Oliveira, presidente do ANDES-SN, que esteve presente no ato em São Paulo junto com outros diretores nacionais representando a entidade.

Manifestação sitiadarepressao copa do mundo

Em São Paulo, o ato “Na Copa vai ter Luta”, que incorporou entre suas bandeiras, a campanha pela readmissão dos metroviários demitidos, foi reprimido já no início da concentração, marcada para às 10 horas, em frente ao sede do Sindmetro, no Tatuapé, às beiras da Avenida Radial Leste, importante via da capital paulista.

Antes do horário marcado para o início da manifestação, homens da força tática da polícia militar cercaram o quarteirão em volta do prédio da entidade e após tentativas de negociação com o comando da operação, os organizadores do ato conseguiram garantir a realização da atividade na rua em frente ao sindicato, com a condição que não houvesse deslocamento para a via principal.

Cercados pela tropa de choque e pela cavalaria da PM, os mais de dois mil manifestantes, se espremiam nos cem metros de rua que lhes foram permitidos. Diversas palavras de ordem reivindicavam mais dinheiro para a saúde e educação públicas, o direito à livre manifestação e o direito ao trabalho.

“Essa repressão descabida só reafirma a necessidade de denunciar essa Copa e o estado de exceção criado pela FIFA, aceito submissamente pelo governo brasileiro”, rechaçou ao microfone o dirigente da CSP-Conlutas Atnágoras Lopes. “Querem mostrar que o país está em festa sem deixar que vejam a insatisfação de diversos setores com os gastos, os desmandos da Fifa nesta Copa, para fazer isso remontaram um aparato repressivo da época da ditadura militar”, completou.

Com a chegada de ativistas de outro movimento, vindos de um ato que já havia sido reprimido pela polícia em uma estação de metrô próxima ao local, com saldo de vários feridos, entre os quais alguns jornalistas, a polícia começou a soltar bombas de gás lacrimogênio, durante a fala das lideranças das entidades presentes, para dispersar o protesto.

“Para conter os trabalhadores, o governo usa sua força repressiva de forma autoritária. Professores, metroviários, estudantes, e diversos outros trabalhadores foram encurralados na rua e depois dentro do Sindicato dos Metroviários pela tropa de choque do estado de São Paulo. Realizávamos uma manifestação pacífica, todos parados numa rua e as falas das entidades ocorrendo no carro som. Em nenhum momento tentamos entrar na Radial Leste (lotada pela tropa de choque), mesmo porque o método da classe trabalhadora é reivindicar, mas sem violência ou confronto físico”, conta Marinalva.

A presidente do ANDES-SN estava em cima do carro som quando a repressão da tropa de choque teve inicio. “Foi uma ação inaceitável. A tropa de choque atacou uma manifestação pacífica com os manifestantes cantando palavras de ordem. As falas no carro de som aconteceram em meio a bombas e balas de borracha. Para proteger nossos manifestantes, pedimos que entrassem no sindicato e fomos cercados, encurralados pela polícia”.

Por orientação da organização do ato, os participantes se dirigiram para dentro do Sindicato dos Metroviários. Durante a movimentação, mais bombas e tiros com balas de borracha, que feriram diversas pessoas.

Houve a tentativa de dar continuidade ao ato dentro do ginásio do sindicato, retomando a fala dos representantes das entidades. Enquanto isso, a cavalaria cercou o sindicato e os gases das bombas começaram a impregnar o ar do ginásio. Os feridos eram atendidos na lanchonete do local. Advogados ativistas contabilizavam as agressões e violações de direitos por parte da força do Estado.

Pouco mais de uma hora depois, veio a imposição da polícia para encerramento do ato, que acontecia dentro do Sindicato dos Metroviários, sob a ameaça de invasão do local pela PM, caso a ordem não fosse seguida. “Por fim, veio a ordem: sair do local sem as bandeiras e em grupos pela direção contrária a radial leste. Nos impediram de manifestar dentro do prédio do sindicato, que é o espaço do trabalhador. Na prática, nos disseram mais ou menos assim: ‘fiquem bem longe da Copa do Mundo, dos estádios, dos jogadores e dos visitantes. Vocês não são bem vindos e, muito menos, as suas vozes e bandeiras. Vocês incomodam o projeto do governo’”, comentou Marinalva, completando: “se incomodamos é porque o projeto que o governo implanta não inclui o povo pobre e os trabalhadores”.

Diante do risco efetivo de ataque à integridade física e moral dos participantes do manifesto, os organizadores orientaram a dispersão em grupo. Na saída, alguns militantes foram agredidos pela polícia, houve relatos de prisões e novo ataque da polícia já na estação do metro Tatuapé.

Ao final da repressão, diversos manifestantes estavam feridos, há relatos de apreensões e ao menos seis profissionais da imprensa, que cobriam a manifestação, também foram feridos por estilhaços de bombas e bala de borracha.

“Embora a repressão seja forte, isso tudo nos fortalece e mostra que estamos no caminho certo, que é fortalecer a organização e a unidade da classe trabalhadora, estudantes e movimentos populares para mudarmos o rumo deste país. E, por isso, a luta crescerá na indignação com nossos métodos democráticos e pacíficos. Nós vamos prosseguir e não há medo! O único medo é de sermos ainda mais espoliados. Temeremos mais a espoliação que a repressão”, finaliza a presidente do ANDES-SN.

Manifestantes foram às ruas em todo o Brasil

Assim como em São Paulo, o dia 12 de junho ficou marcado por dezenas de manifestações realizadas em todo o país, que integraram a jornada “Na Copa Vai Ter Lutas” e outros atos organizados por movimentos sociais, sindicais, populares e da juventude de vários estados brasileiros, em cidades como Porto Alegre, Florianópolis, Rio de Janeiro, Maceió, Salvador, Belém, Fortaleza, Belo Horizonte, Aracaju e Brasília.

Rio de Janeiro – O ANDES-SN e suas Seções Sindicais participaram do Ato Unificado das Categorias em Greve e em Luta, com concentração pela manhã em frente à Candelária. Os docentes do Rio de Janeiro integraram o protesto que denunciou a concessão do Maracanã, as remoções na cidade, além da repressão contra os trabalhadores.

Centenas de pessoas estenderam faixas sobre a Copa e a favor da educação e da saúde, que destacavam palavras de ordem como “Fifa go home” e “Gari vale

mais do que Neymar”, “Copa sem povo, tô na rua de novo” e “30 dias virou R$ 30 bilhões”, referindo-se ao gasto total com a Copa do Mundo.

O ato foi violentamente reprimido pela polícia. De acordo com o Jornal do Brasil, ao menos quatro manifestantes foram detidos durante a ação da polícia militar, que novamente utilizou sprays de pimenta e gás lacrimogênio para impedir a mobilização. A violência ocorreu nos Arcos da Lapa, centro do Rio de Janeiro, ao final da manifestação que percorreu toda a Avenida Rio Branco, em direção à Cinelândia.

À tarde, o protesto “Não vai ter Copa! Fifa Go Home” também reuniu manifestantes na praça Cardeal Arcoverde, em Copacabana, que criticou as remoções forçadas, os gastos excessivos com obras “totalmente ineficientes”, a elitização dos estádios e a forte repressão aos protestos.

O novo outdoor da Adufrj, Seção Sindical do ANDES-SN, localizado na lateral do antigo Canecão, também faz críticas aos gastos públicos com a Copa do Mundo em detrimento do que deveriam ser as prioridades das autoridades brasileiras: saúde, educação, cultura, moradia e transporte. O outdoor permanecerá instalado durante o período dos jogos.

Brasília – Representantes de movimentos sociais e sindicais, entre eles a CSP-Conlutas, Fasubra e Sinasefe, em greve desde 17 de março e 21 de abril, respectivamente, participaram de ato realizado na plataforma inferior da Rodoviária do Plano Piloto, no início da tarde. Cartazes e faixas reivindicavam verbas para a Educação e ressaltavam a Copa das Manifestações.

Em seguida, mais de 200 manifestantes se deslocaram até Taguatinga, região administrativa do Distrito Federal, onde se concentraram para caminhar até a Fifa Fan Fest, evento organizado pela Fifa durante a Copa do Mundo em cidades brasileiras. Os manifestantes foram impedidos de se aproximar da Fan Fest pela Polícia Militar. Ao reprimir a manifestação, os policiais montaram um cordão de isolamento com cavalaria e usaram spray de pimenta contra os manifestantes. Duas pessoas foram detidas e levadas ao Departamento de Polícia Especializada durante manifestação. A PM ainda arrancou das mãos de manifestantes a faixa do ato, escrita em português, inglês e espanhol.

A advogada Érika Medeiros, que acompanhava a manifestação, denunciou que foi agredida por policiais quando tentava prestar assistência jurídica aos detidos. “No momento em que a primeira pessoa foi detida fui impedida de exercer minha profissão, inclusive levei uma chave de braço de um policial e um puxão de braço de outro. Não me deixaram passar mesmo tendo me identificado como advogada”, denunciou a advogada à Agência Brasil.

Porto Alegre – Por negociações e em defesa de serviços públicos de qualidade, movimentos sociais, organizações de esquerda e a juventude Porto Alegre realizaram o ato unificado Nossa Copa É Na Rua!, contra as injustiças da Copa, que reuniu cerca de 1,5 mil pessoas.

Florianópolis – Entidades estudantis e sindicais de diversas categorias integraram ato para denunciar as injustiças da Copa, em frente ao Terminal de Integração Centro (Ticen), em Florianópolis, além de reivindicarem saúde, educação e salários de qualidade.

Maceió – A classe trabalhadora e a juventude de Alagoas realizaram panfletagem no Porto de Maceió, na manhã do dia 12.

Belém – O ato público contra os gastos excessivos da Copa do Mundo marcou o último dia da paralisação de 72 horas dos docentes da UFPA, realizado a partir das 9h na Praça Santuário, no bairro de Nazaré. Os professores da universidade se juntaram às demais categorias em luta e organizações dos movimentos sociais e a juventude para lutar contra as injustiças da Copa do Mundo, exigindo mais dinheiro para saúde, educação, moradia e transporte público de qualidade.

Belo Horizonte – Na capital mineira, a manifestação, realizada na Praça da Liberdade, zona central da cidade, também foi duramente reprimida pela polícia militar. Os manifestantes denunciaram a violência utilizada pela polícia e as prisões arbitrárias, além das balas de borracha e bombas de gás usadas para reprimir o protesto. 11 pessoas foram detidas e um adolescente apreendido.

Entre os feridos durante a manifestação está o repórter fotográfico da Agência Reuters Sérgio Moraes, que teve traumatismo craniano. O objeto que o atingiu ainda não foi identificado, e ele foi internado no Hospital Pronto Socorro João XXIII.

No Triângulo Mineiro, servidores da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM) em greve fecharam a ligação entres os estados de Minas Gerais e São Paulo, na BR-050 entre Uberaba (MG) e Igarapava (SP).

A Apes-JF, Seção Sindical do ANDES-SN, organizou, com várias outras entidades, protesto que reivindicou melhores condições de moradia, educação e saúde. O ato se concentrou no parque Halfeld, em Juiz de Fora, no final da manhã. Na quarta (11), o movimento “Na Copa Vai Ter Luta” promoveu um debate sobre a Copa do Mundo, com o professor Hajime Nozaki, da UFJF.

  • Assim como em outros protestos realizados pelo país, houve confronto com a polícia, que reprimiu duramente o ato e prendeu manifestantes.

  • *Com informações do G1, Jornal do Brasil, Agência Brasil, página do facebook das Seções Sindicais, página do facebook do PSTU
  • Fonte: ANDES-SN