Centros criticam falta de amplo debate sobre ensino remoto na Ufes

Unidades não aceitam a condução da discussão sobre o Ensino-Aprendizagem Remoto Temporário e Emergencial (Earte) por parte da Reitoria e destacam que diálogo e transparência são fundamentais na elaboração de um plano de retorno às atividades, seja remoto, híbrido ou presencial.

Há, em vários Centros de Ensino da Universidade, grande insatisfação com encaminhamentos feitos pela Reitoria em relação à implantação do Ensino-Aprendizagem Remoto Temporário e Emergencial (Earte) e que deve marcar o retorno das atividades de ensino na Ufes. No último dia 27, a Câmara Central de Graduação aprovou a proposta de resolução que recomenda a criação de período letivo especial, com início em 1º de setembro e duração de 15 semanas. A decisão final caberá agora ao Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe).

Desde que foi incluído o ensino remoto no Plano de Contingência da UFES, a condução das discussões por meio de prazos e informações insuficientes, impede que vozes divergentes sejam escutadas. Apesar disso a Reitoria vem informando à sociedade que todas as decisões em torno da proposta do calendário especial estão em comum acordo com os diferentes setores. No entanto, documentos de reuniões de centros e departamentos, alguns deles divulgados nesta reportagem, mostram o contrário e questionam, por exemplo, o curto período para discussões, destacando a inadequação de deliberação tão séria  justamente no período de férias. “De total de 1885 docentes, 1117 estavam em férias em julho, pois desde março uma Instrução Normativa do Ministério da Economia vedou cancelamento, prorrogação ou a alteração dos períodos já programados”, frisa a presidenta da Adufes, Ana Carolina Galvão.

A Adufes solicitou à Reitoria a divulgação da proposta de resolução do Earte aprovada na Câmara Central de Graduação e recebeu retorno informando que “A versão final, após discussão e deliberação nas Câmaras [locais], se encontra no sistema de protocolo da Ufes, sob o registro 23068.032104/2020-56, desde o dia 31/07/2020, às 09:59”. Porém, somente quem tem acesso ao sistema e ao número do protocolo pode acompanhar as informações, que não foram amplamente divulgadas como devolutiva aos Centros.

A Reitoria, em matéria publicada no Portal da Ufes, no dia 30/7 afirma que o processo “envolveu fortemente a comunidade acadêmica, por meio de enquetes aplicadas aos estudantes, docentes, técnicos-administrativos e gestores, de participação do reitor, vice-reitor e pró-reitores em reuniões dos conselhos departamentais, de debates em cada unidade de ensino e administrativa e de coleta de dados necessários para se chegar a um conhecimento institucional mais próximo possível do real”. No entanto, alguns Centros registram que não houve essa participação da Administração Central e em outros, a participação não foi aberta a todas/os as/os discentes e servidoras/es.

Vozes discordantes. Em reunião  no dia 23/7, os participantes do Fórum do Centro de Educação manifestaram surpresa ao tomar conhecimento que, em reunião conjunta dos Conselhos Universitário (CUn) e de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe), foi apresentada “versão final dos planos de Biossegurança e de Contingência”. Ato contínuo, aprovaram um cronograma que prevê a definição de normas visando à aprovação de resoluções que tratam da oferta de ensino, de pesquisa e de extensão nas diferentes fases da pandemia.

Pelos registros do relatório do Fórum do CE (leia aqui a manifestação nas páginas 2 a 5 do documento) , a publicação de matéria no site da Ufes mostrou que a “Reitoria não submeteu os planos à aprovação dos Conselhos e  considerou finalizado o debate, contrariando indicação feita pelo CE e por outros centros de ensino”.

Da mesma maneira, reunida em 23/07, a Câmara Local de Graduação do CCHN assinala “a gravidade da situação e, portanto, a imprescindibilidade da construção realmente coletiva de alternativas institucionais” (leia aqui o documento ofício enviado à Prograd) .

Precarização do ensino. Como vem reiterando, a Adufes defende a necessidade de aprofundar o debate sobre o significado das atividades remotas, que “precarizam o ensino, afetam a saúde física e psicológica de toda comunidade acadêmica e geram exclusões, dentre outros prejuízos”, como pontua Ana Carolina, em reflexão também feita pelo Departamento de Terapia Ocupacional (DTO) (leia aqui o documento), do Centro de Ciências da Saúde.

Conforme dados obtidos por meio de questionários aplicado com docentes, técnicos administrativos em educação e discentes do curso de Terapia Ocupacional, a maioria não possui ferramentas e ambiente tecnológico adequado. Além disso, 45% das/os servidoras/es “disseram estar em condições emocionais ruins e 36% em péssimas condições emocionais, com sobrecarga de tarefas”. Entre discentes, 79,7% responderam que “não apresentam condições emocionais para estudar em casa”.

No Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE), o presidente da Câmara Local de Graduação, Rogério Faleiros, que atuou na elaboração do Plano de Contingência da Ufes, apontou  medidas para “atender à necessidade de inclusão digital do corpo discente”, frisando que o debate sobre o caráter excludente do Earte não foi ignorado (leia aqui a ata do CCJE). Na reunião realizada em 23/7, Faleiros garantiu que a universidade conta com destaque orçamentário específico para adquirir equipamentos e dados de internet.

A professora Salyanna de Souza Silva, que também participou da reunião no CCJE, registrou posicionamento do Departamento de Serviço Social contra a implantação do Earte  e  apresentou resultados de enquete feita por sua unidade, que chamam a atenção para a comparação com a enquete realizada pela Ufes (leia carta completa aqui).

Duzentos e quarenta e oito discentes (54,71%) das/os matriculados responderam à consulta aplicada para avaliar reais condições de vida dos estudantes no contexto da pandemia e suas possibilidades de acesso à internet. Do universo pesquisado, 12,2% mudaram de endereço e passaram a morar em áreas rurais; 78% disseram não ter condições adequadas para estudo em suas residências e 80% compartilham equipamentos com familiares em trabalho remoto ou com filhos.

Etapa final? Segundo o cronograma que a Reitoria está seguindo, a próxima e última etapa consiste nas deliberações nos Conselhos Superiores, agendadas para os dias 12 e 13/8. Porém, a aceleração do processo mais uma vez impede o amplo debate. “Continuamos empenhados em discutir os documentos, propostas e ouvir a comunidade acadêmica”, diz a presidenta da Adufes. Segundo ela, a fim de escutar as múltiplas vozes que a Ufes abriga, a Administração Central não poderia deixar de proporcionar condições para uma reflexão madura e dialógica, mas  preocupar-se de fato com as condições de vida e educação de suas/seus estudantes e servidoras/es, o que não vem ocorrendo, lamenta Ana.

Fonte: Adufes