Um “Estatuto novo” para quem?

O caráter antidemocrático dá as caras novamente: desta vez o alvo é o Estatuto da Universidade!! Em abril  deste ano a Ufes instituiu uma Comissão Mista para elaborar seu novo Estatuto e o Regimento Geral. A revisão dos documentos está sendo feita pela vice-reitora e por 12 representantes dos Conselhos Superiores (Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão/Cepe e Conselho Universitário/Cun).

O grupo foi escolhido pelos próprios conselheiros, ou seja, não houve consulta à comunidade universitária. A reforma das normas, portanto, ocorre de forma antidemocrática, sem um processo estatuinte que permitiria ouvir professores, estudantes e técnico-administrativos.

De acordo com a vice-reitora Ethel Maciel,  presidente da comissão, o objetivo do grupo é adequar os documentos à realidade da instituição, porém,  sem estatuinte. “Estamos estudando os Regimentos e os Estatutos de várias universidades do Brasil, além de documentos de instituições que passaram recentemente pelo processo de revisão de suas normas”, disse.

Consulta por e-mail. A proposta é que sejam feitas as modificações nas novas legislações da universidade e que a comunidade acadêmica opine por e-mail. Para o diretor da Adufes, Rafael Vieira Teixeira, a estatuinte é uma demanda antiga da comunidade universitária. “As diferentes administrações que já assumiram a universidade não aceitaram este desafio e o problema se estende até hoje. Uma reforma estatutária não pode  simplesmente utilizar e-mail como canal de consulta”, critica o diretor.
Desde sua criação, a comissão vem realizando reuniões de pesquisa. A atividade  ocorre sempre as segundas-feiras, no prédio da reitoria. A finalização dos trabalhos segue sem data prevista.

Composição da comissão é centralizada. Instituída pelo reitor e referendada pelos Conselhos, a comissão mista não foi definida de forma consensual. “A atual formação da comissão privilegia os representantes dos conselhos e não contempla a Adufes, Sintufes e o DCE. Isso dificulta a ampliação do debate”, garante Rafael. Ele lembra que é importante também a participação da sociedade civi para se construir normas democráticas.

Última estatuinte na Ufes ocorreu há mais de 20 anos. De forma tímida, em 1992,  a universidade realizou um processo estatuinte para alterar seu Regimento Geral. O documento, que ainda está em vigor, foi construído na década de 80,  logo após o fim do regime militar.   

Já o atual Estatuto da Ufes está  em vigor desde 2002.  Porém, em uma década, a universidade sofreu muitas transformações no âmbito administrativo e acadêmico exigindo , portanto, um estatuto mais condizente com a atual realidade. É necessário que o mesmo contemple pontos como a instituição do regime de cotas e a criação do Centro Universitário Norte do Espírito Santo (Ceunes). E da forma como está sendo conduzido o processo – sem convocação de estatuinte – , teremos novas legislações conservadoras e autoritárias.

Universidades na luta por  estatuintes. O debate estatuinte também está sendo realizado pelas Universidades da Bahia (UFBA), Pernambuco (UFPE), Santa Maria (UFSM), Paraíba (UFPB),  Recôncavo da Bahia (UFRB), Paraná (APUFPR), além da Estadual de Feira de Santana (UEFS). O ponto comum de discussão nessas instituições  – que sofrem com a pressão produtivista, a falta de autonomia universitária, problemas de infraestrutura, por exemplo – , é a necessidade de criação de um instrumento normativo mais participativo e que compreenda os anseios da comunidade acadêmica.

Comunidade acadêmica exige estatuinte na Ufes

Representantes de vários segmentos da Ufes destacam que novas legislações devem passar por um processo Estatuinte. A comunidade universitária tem a tarefa de pensar a si mesma para enfrentar os diferentes desafios da Ufes.  A tarefa impõe a atualização das formas, normas e estruturas de regramento da Universidade, ou seja, realização da estatuinte. A metodologia para elaboração desse processo deve ser feita somente após consulta à comunidade.

“A estatuinte pressupõe fases como a constituição de uma comissão, divulgação das informações, reuniões, palestras, debates, seminários, assembleias setoriais, gerais e específicas, escolha de delegados e sistematização das atividades. São essas etapas que possibilitarão a participação de todos que compõem o ambiente universitário, como professores, técnico-administrativos e estudantes”, descreve o presidente da Adufes, Edson Cardoso.

Ele explica que também faz parte da metodologia a convocação de Congresso Universitário Estatuinte, espaço onde as propostas devem ser ampliadas, modificadas, ajustadas e referendadas. E só após a aprovação pelo Congresso Estatuinte é que o Regimento Geral e o Estatuto serão submetidos à apreciação do Conselho Universitário e,  uma vez homologados e aprovados, encaminhados ao MEC.

“A vida universitária deve se constituir em um espaço de democracia, não como um pressuposto legal, mas um espaço de aprendizagem”, defende Edson.
Autonomia universitária.Para discutir novas normas para a universidade é preciso que seja levada em consideração à autonomia universitária. “É necessário que a comissão estatuinte (e não um grupo isolado), proponha um cronograma de atividades para debater o papel da universidade e a instituição de ensino que queremos”, sugere Vinicius Machado, estudante de História da Ufes.

O representante do Sindicato dos Trabalhadores na Ufes, José Mageski,  também considera importante o debate. Para ele, é preciso  reformular os Conselhos Superiores da universidade   a fim de que a representação dos segmentos seja paritária. “Precisamos continuar resistindo ao autoritarismo e lutar para que espaços democráticos de decisão sejam criados na Ufes”, disse Mageski.

Fonte: Adufes