Vitória: STF rejeita ação que pedia cancelamento da demarcação de terras quilombolas

Por maioria dos votos, o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou nesta quinta-feira (8) a constitucionalidade do decreto 4.887, que regulamenta a demarcação de terras de comunidades quilombolas no país. Com a decisão, os ministros negaram a ação direta de inconstitucionalidade (Adin 3239), ajuizada pelo partido Democratas (DEM), que queria derrubar o decreto.

O resultado do julgamento é uma vitória para milhares de comunidades quilombolas, que estavam sob ameaça de perder seus territórios. Segundo o site Repórter Brasil, estima-se uma população quilombola de 16 milhões de pessoas no país.

Ajuizada em 2004 pelo DEM (partido do presidente da Câmara Rodrigo Maia), a serviço dos interesses da bancada ruralista, a ação questionava o decreto editado no governo Lula, que regulamentou a titulação das terras quilombolas, garantida pela Constituição de 88. A legenda apontava supostas inconstitucionalidades, entre elas o critério de autoatribuição fixado no decreto para identificar os remanescentes dos quilombos e a caracterização das terras a serem reconhecidas a essas comunidades.

A Adin ameaçava não só paralisar o andamento dos processos de titulação de terras, como as que já estavam tituladas. A ação ficou parada por mais de oito anos no Supremo e teve o julgamento iniciado em 2012. Desde então, pedidos de vistas atrasaram a decisão final, ocorrida nesta quinta.

Foram 8 votos a favor da constitucionalidade do decreto, dois votos parciais e um contra o questionamento. Votaram a favor da manutenção do decreto os ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Roberto Barroso, Edson Fachin, Marco Aurélio, Luiz Fux, Celso de Mello e Alexandre de Moraes. Houve somente uma posição favorável ao pedido do DEM, que foi dado pelo ex-ministro Cezar Peluso, em 2012, quando era relator do caso.

Dias Toffoli e Gilmar Mendes acataram parcialmente o pedido do DEM para validar apenas a titulação de áreas ocupadas pelos quilombolas na data da promulgação da Constituição de 88 , salvo comprovação de perda da posse em função de atos ilícitos. Esse limite é chamado de marco temporal. Caso fosse aprovado, ficariam de fora, por exemplo, muitos quilombolas que já haviam sido expulsos de suas terras por invasores. Mas, com a maioria dos ministros tendo rejeitado a Adin, a questão do marco temporal foi suprimida, em outro importante resultado. 

Uma vitória da luta dos quilombolasSegundo Wagner Silva, do Setorial do Campo da CSP-Conlutas, essa decisão do STF é uma importante vitória, que só foi possível graças à luta. “Na maioria das vezes, esse mesmo judiciário tem ordenado diversas reintegrações de posse contra comunidades quilombolas pelo país a favor de latifundiários, grileiros e do agronegócio. A forte resistência e luta dos quilombolas no último período é que possibilitou essa conquista”, avaliou.

“Como o Estado não garante o andamento dos processos de titulação de terras, o que temos visto no último período é que os quilombolas estão ocupando territórios, numa política de autodemarcação, de retomada de seus territórios”, disse.

Movimentos quilombolas e indígenas acompanharam de perto a tramitação da Adin 3239. No ano passado, centenas de manifestantes foram a Brasília para um protesto e para acompanhar uma das sessões no STF. O Moquibom (Movimento Quilombola do Maranhão), filiado à CSP-Conlutas, levou uma caravana para o ato e tem estado à frente da organização da luta dos povos quilombolas e indígenas.

A luta continuaOutros ataques seguem em curso no Congresso. A bancada ruralista tenta aprovar há vários anos a PEC 215, que transfere para o Congresso o poder de demarcar ou não novas terras indígenas. Ou seja, querem impedir de vez o reconhecimento de terras indígenas, quilombolas e unidades de conservação ambiental para deixar o caminho livre para grileiros, ruralistas e latifundiários, os responsáveis pelos graves conflitos e mortes no campo.

Essa ofensiva tem todo apoio do corrupto governo Temer que no ano passado perdoou R$ 10 bilhões em dívidas dos ruralistas em troca de apoio para barrar o pedido de abertura do processo por corrupção na Câmara.

O descaso com a demarcação e titulação de terras também se dá com a redução de verbas. Em 2017, o Orçamento da União destinou R$ 4,1 milhões para a atividade – o menor volume desde pelo menos 2009. Os valores vêm caindo desde 2012, quando foram reservados R$ 51,7 milhões para a regularização desses territórios. Entre 2015 e 2016, ainda no governo de Dilma (PT), o orçamento da pasta caiu 80%. Desde dezembro de 2016, as titulações e, da mesma forma, as declarações de terras indígenas – estão paralisadas.

“Sabemos que vem pela frente mais ataques duríssimos. Temos um governo e um Congresso com uma pauta anti-quilombola, anti-indígena, que funciona sob a lógica do latifúndio e do agronegócio. Mas a nossa resistência vai ser na mesma proporção. Se tem ataque, vai ter resistência, vai ter retomada de território, vai ter organização pela base para construir a resistência”, concluiu Wagner Silva.

*Com informações site STF

Fonte: CSP-Conlutas