Portaria n° 150-R da Sedu aumenta a precarização do trabalho docente e amplia a privatização da educação pública no ES 

As novas diretrizes para a Rede Pública de Ensino Estadual estão na contramão da autonomia docente e da qualidade do ensino.

As regras que foram publicadas no Diário Oficial do Estado aumentam a carga horária em sala de aula e reduzem o tempo de planejamento docente. Além disso, minora conteúdos de disciplinas das Ciências Humanas, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio, como História, Filosofia e Sociologia. A Secretaria da Educação (Sedu) divulgou as diretrizes para as Organizações Curriculares na Rede Escolar Pública Estadual para o ano letivo de 2021, por meio da Portaria nº 150-R, publicada no dia 14 de dezembro.

O documento alinha-se às contrarreformas educacionais aprovadas nos últimos anos, com destaque para a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), a Nova Lei do Ensino Médio e a Política Nacional de Avaliação e Exames da Educação Básica. Neste contexto marcado pelo neoliberalismo e conservadorismo, ideologias voltadas para o mercado, como a nova normativa da Sedu supervalorizam os princípios técnico-burocráticos.

As mudanças condenam jovens pobres a uma educação cada vez mais precária e instrumental. O resultado é o aprofundamento da dualidade educacional e do acesso desigual ao saber elaborado, sistematizado que essa política impõe  à  classe trabalhadora. Estamos diante do aumento do fosso que separa as/os estudantes das escolas públicas em relação aos estudantes das escolas privadas.

O professor de História da rede estadual, Vinicius Machado, critica a implementação das diretrizes  por entender se tratar da expansão do projeto empresarial de educação nas escolas públicas, isto é, do aprofundamento de um modelo mercadológico já em curso. “[As diretrizes] Reforçam tendências internacionais de centralização curricular com o objetivo de controle político-ideológico do conhecimento, viabilizando a avaliação em larga escala, externa às unidades escolares e, em consequência, responsabilizando as/os professoras/es e as/os gestoras/es pelos resultados da aprendizagem”.

Vinícius salienta ainda que, nesse processo, a Sedu ignora as condições efetivas para a realização das atividades educacionais, como a infraestrutura disponível nas escolas e as condições de trabalho docente. Por essas razões, o professor considera a Portaria nº 150-R um instrumento centralizador, autoritário, reducionista e de controle dos conteúdos a serem ministrados em sala de aula.

Precarização intensificada. No novo modelo de 6 horas por turno, no caso do Ensino Médio, como traz as diretrizes, há um aumento da carga horária das/os professoras/es em sala de aula e a diminuição do tempo de planejamento. Terão que lecionar mais aulas para cumprir o novo formato que era de 18 horas, passando agora para 20 horas-aulas semanais.

O docente conta que algumas mudanças já vêm sendo implementado desde o ano passado em algumas “escolas piloto”. Em 2020, passou a ser adotado nas instituições de ensino da Grande Vitória e, a partir deste ano, será expandido para todas as escolas do Estado juntamente com as novas diretrizes curriculares. O engodo, segundo Vinícius, está na tentativa da Sedu de demonstrar que as mudanças vão trazer um acesso igualitário para as/os estudantes e melhorias nas condições de trabalho docente.

Por conta da baixa remuneração salarial, a maioria das/dos professoras/es têm mais de um emprego e com as novas mudanças curriculares a sexta aula estrangulará o tempo de deslocamento de uma escola para a outra. “Pode significar ficar sem almoço, ter que deixar carga horária em outra escola/rede devido a incompatibilidade de horários e até perder a vida em acidentes de trânsito”, diz Vinícius, preocupado com as condições de trabalho docente. As novas diretrizes incorporam o modelo da Escola Viva e dão  um formato curricular de escola de tempo integral a  escolas que são, na verdade, de tempo parcial.

Educação tecnicista. Outro aspecto preocupante foi a redução da carga horária de diversas disciplinas. Trata-se de conteúdos de História, Filosofia, Sociologia, Geografia, Artes e Educação Física. O professor explicou que “ao mesmo tempo em que essas disciplinas têm redução de carga-horária, são incluídas partes diversificadas no currículo, constituídas pelos seguintes componentes:  Ensino Fundamental – Projeto de Vida e Estudo Orientado com registro de frequência e conceito “cursado”; e Ensino Médio – Língua Estrangeira Moderna (Língua Espanhola), Redação, Cultura Digital e Componentes Integradores (Projeto de Vida, Estudo Orientado, Eletivas)”.

A nova organização curricular representa na prática mais trabalho e maior precarização, maior perda de autonomia e da liberdade de ensino e, consequentemente, aumento do controle do trabalho educativo. “Currículos minimalistas, pragmáticos e utilitaristas, como é o caso da nova organização curricular da Sedu, buscam formar sujeitos “produtivos”, adaptados, flexíveis, dóceis e resilientes, capazes de aceitar com passividade as desigualdades, a precarização do trabalho e o desemprego”, aponta Vinícius.

Para ele, o papel da escola é contribuir na formação de sujeitos sociais críticos, que saibam se posicionar diante dos desafios da vida e não apenas servir de mão de obra para o mercado. “Está sendo negado o acesso ao conhecimento geral possibilitado pelas disciplinas das Ciências Humanas. A medida priva as/os estudantes de serem capazes de construir e mudar sua realidade e romper com as opressões”, frisa o professor.

Ao contrário do que pode parecer, o aumento da carga horária não significa, sobretudo na educação integral, garantias da oferta do ensino de qualidade e crítico.  Pelo contrário, promove o esvaziamento curricular. A implementação dessa nova organização curricular nada mais é, de acordo com o docente, do que “um novo capítulo da hegemonia do projeto empresarial de educação nas escolas públicas do ES”.

A médio prazo, as mudanças curriculares aumentarão a taxa de desemprego entre as/os docentes das redes municipais e estadual. Vinícius Machado lembra que hoje 60% das/os professoras/es do estado são de Designação Temporária (DTs) e com a supressão de parte do conteúdo, muitas/os docentes perderão postos de trabalho, sobretudo nas disciplinas de Ciências Humanas.

Leia a Portaria nº 150-R na íntegra aqui.

 

Adufes