Exclusão via ensino remoto, insegurança via retorno híbrido na Ufes

Earte é marcado por evasão e exclusão de estudantes, queda na qualidade do ensino, adoecimento de docentes e intensificação da precarização do trabalho

Em 2020, mais precisamente em nove de setembro, foi implementado o Ensino-Aprendizagem Remoto Temporário e Emergencial (Earte) na Ufes. Um ano depois, as aulas remotas continuam sendo situações complexas e desafiadoras para professoras/es e estudantes.

O Earte pode ser considerado desastroso em vários aspectos na medida em que, como aponta pesquisa da Adufes, diminui o desempenho das atividades acadêmicas e do aprendizado e contribui para a exclusão e evasão de estudantes.

Além do estresse causado pela situação pandêmica, as/os docentes tiveram que lidar com falta de estrutura e formação apropriada, a precarização do trabalho, adoecimento, bem como a dificuldade em conciliar as rotinas de ensino com as tarefas domésticas e a convivência familiar.

Precipitação se repete. Com a mesma dinâmica por meio da qual a implementação do Earte foi aprovada, de forma aligeirada, sem amplo debate com a comunidade acadêmica, a Universidade decidiu adotar  atividades remotas e presenciais exclusivamente para a parte prática das disciplinas ofertadas aos estudantes finalistas, a critério dos departamentos, a partir de 3 de novembro, ignorando as deficiências de aspectos estruturais e educacionais da instituição diante da Covid-19.
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Política temerária . Agora, com a retomada de parte das atividades presenciais, resta saber se a estrutura da Universidade é realmente capaz de abrir os espaços coletivos de forma segura. “Basta olhar para as edificações para verificar que elas não possuem garantias de ambientes saudáveis para estudantes, docentes  e para os servidores que ali trabalham”, frisa a presidenta da Adufes. Ela ainda considera que a baixa cobertura vacinal da população até o momento (que não permite atestar seguramente qual percentual estará com esquema de imunização completo até o final do ano), bem como as condições de infraestrutura material, física e de pessoal, poderão acarretar danos à saúde da comunidade universitária, sobretudo em face da variante Delta.

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Problemas do  Earte merecem atenção

 

Ana Claudia Meira, professora do Centro de Ciências Agrárias e Engenharias (CCAE/Alegre), campus de Alegre, e, também, integrante do Conselho de Representantes da Adufes, critica a inércia da universidade sobre a necessidade de promover melhorias no Earte e, para ela, “se algo foi possível”, deve-se ao empenho profissional da categoria. Junto a isto, destacou que professoras e professores se desdobraram economicamente para “adquirir ou melhorar o computador, comprar cadeira ergonômica, aumentar a capacidade da internet em casa ou ter celular mais potente, despesas que a instituição não reconhece”.

De acordo com a professora, no campus de Alegre (Sul/ES), muitos alunos já informaram que terão dificuldades para se manter na cidade para cursar poucas disciplinas. “O custo da permanência é alto e não estamos percebendo investimentos para ofertar as disciplinas com segurança no sistema híbrido”. Enquanto a categoria, colegiados de curso e departamentos questionam as condições para a volta segura, segundo Ana Claudia, a resposta da reitoria têm sido “se não for possível, não volta” e “voltam aqueles que podem”, reforçando o discurso excludente e elitista do Ministro da Educação em relação ao direito de todas/os à educação. Acesse formulário “Acompanhamento jurídico ao trabalho remoto

Professora Laura Silveira conta os desafios do malabarismo de ser mãe e professora durante o ensino remoto

A professora de Literaturas de Língua Inglesa do Departamento de Línguas e Letras, Laura Silveira, considera que embora a educação remota seja apresentada como uma das limitadas alternativas, diante da excepcionalidade do momento, ela impede mecanismos essenciais ao processo de ensino e aprendizagem de qualidade. “Ainda que o Earte esteja longe do ideal, no momento ainda é o mais seguro e a única forma de garantir o estudo”, disse, defendendo imunização em massa e condições adequadas para o trabalho remoto.

Mãe de dois filhos que também fazem aulas online, Laura explica que lidar com as obrigações da docência e da pesquisa junto com os cuidados com a família não é tarefa fácil.  “Antes, tinha a falsa sensação de que conseguia conciliar tudo, e agora com tudo misturado dentro de casa, estou trabalhando muito mais”, diz, queixando-se do desconforto físico em função de muitas horas na frente da tela.

Para dar voz a relatos como esse, a pesquisa realizada pela Adufes  ouviu 642 docentes, que, em sua maioria– 56,06% –  identificaram-se como mulheres, e um dado chama a atenção: nenhuma das respondentes disseram trabalhar dentro da jornada de 8 horas. Para 67,25%, a carga horária varia entre 8h e 10 horas, enquanto 32,75% trabalham mais do que isso.

Mateus no Restaurante Universitário antes da pandemia Covid-19

Mateus Nimer é um dos alunos de graduação da Ufes que teve a vida estudantil alterada pela pandemia. Ele ingressou no curso de Psicologia durante o Earte (semestre 2021/1) e, embora refira-se ao Earte como dos males o menor, o estudante continua considerando a modalidade inadequada. “Queremos voltar, mas não de qualquer jeito. Queremos estrutura adequada, distanciamento recomendado, e a devida limpeza dos espaços, que são princípios básicos de segurança e defesa da vida”, frisa, revelando que sente saudades da convivência do ensino presencial tradicional. Antes de cursar Psicologia, Mateus foi aluno da Engenharia.

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