A luta pelos direitos das mulheres também é uma luta pela classe trabalhadora

No Dia Internacional da Mulher (8 de março), a Adufes reafirma seu compromisso com a luta contra todas as formas de opressão e ouve três mulheres atuantes na luta feminista sobre os desafios da atualidade

A luta coletiva pela conquista de direitos e pelo respeito aos direitos já conquistados pelas mulheres passa pelo combate às diversas opressões e violências cotidianas enfrentadas nos mais diversos espaços, desde os ambientes de trabalho até as instâncias de poder e representação política. E essas lutas também são lutas da classe trabalhadora, uma vez que as violências e opressões sofridas por mulheres são parte das engrenagens que mantêm a máquina capitalista funcionando.

O assédio sofrido por mulheres, não apenas sexual, é algo estrutural nos ambientes institucionais, seja na iniciativa privada, no setor público e até mesmo nas entidades de luta política como sindicatos, movimentos populares e associações. E o problema é ainda mais acentuado quando se refere a mulheres negras.

De acordo com Vanda de Souza Vieira, coordenadora de Organização do Movimento Negro Unificado (MNU), o problema engloba “salários, feminicídios, mortalidade materna por tratamento diferenciado no pré-natal, violência no momento no parto pela crença de que mulheres negras suportam mais dor, estupro contra mulheres e meninas, principalmente na faixa dos 7 aos 14 anos, o que tem relação com a hiperssexualização das mulheres que, desde o processo de escravização, sofrem com a violência sexual”.

Violência Política

E o machismo e misoginia também atingem mulheres que alcançam posições de representação e poder. A violência política de gênero acompanha as mulheres ao logo de toda a trajetória nesses espaços, desde as manifestações mais sutis, como um comentário sobre a roupa ou piadas desagradáveis, até as mais explícitas como silenciamentos, agressões verbais, psicológicas e até mesmo físicas. É o que explica a deputada estadual Camila Valadão.

“A execução de Marielle Franco é um exemplo de como a violência política de gênero precisa ser combatida. E isso não é um problema apenas nos espaços políticos institucionais, como os parlamentos, onde acontece muito, mas também em outros espaços de poder e políticos que as mulheres ocupam. Até mesmo nas reitorias de universidades, colegiados e departamentos”, alertou.

A deputada lembra que essa violência ganha novos contornos com a chegada da extrema-direita conservadora aos parlamentos em número maior, o que faz o enfrentamento ser cada vez mais brutal. “O que era mais velado fica mais explícito, com mais agressividade, sujeitando mulheres com mandato às violências de apoiadores dos parlamentares de extrema-direita nas redes sociais, com ameaças contra a vida delas. Muitas parlamentares precisam de escolta e acionam órgãos de proteção na Justiça para que tenham o mandato, que foi dado pelo voto popular, garantido. A violência é anterior, mas ganha contornos mais dramáticos nesse novo cenário”.

Bases

Sobre a conjuntura atual, a parlamentar lembra que o Brasil acaba de sair de um cenário de muita dureza. “Vemos uma janela de esperança para voltar a fazer luta política, entendendo que é o momento de fortalecer nossas bases para a luta que precisamos fazer no país, enfrentando o conservadorismo e a extrema-direita que estão muito enraizados e em número muito expressivo em vários espaços”.

Camila Valadão lembra que houve poucos avanços na história no que diz respeito à participação política de mulheres. “Ampliamos a conta-gotas o número de parlamentares, prefeitas, governadoras. São espaços emblemáticos para evidenciar as desigualdades tão denunciadas pelas mulheres. Temos 18% de deputadas federais e esse número não é para ser comemorado. É para ser denunciado. Só temos quatro deputadas na Assembleia Legislativa do Espírito Santo, entre 30 parlamentares. Isso também é uma denúncia. Avançamos pouco e para conseguirmos um sistema político que nos represente é preciso que haja mudanças radicais e estruturais, com uma reforma política urgente que coloque a mulher como prioridade, com paridade nos espaços políticos”.

Gênero

É preciso frisar que as relações de gênero ainda hoje são desiguais. De acordo com Edna Calabrez, representante do Fórum de Mulheres do Espírito Santo (Fomes), a valorização do trabalho realizado por homens (trabalho produtivo), em detrimento do realizado por mulheres (trabalho reprodutivo), é fruto da hierarquização entre os gêneros. Estas relações se colocam a partir do patriarcado e têm como base a divisão sexual e social do trabalho, que organiza, sem ordem de prioridades, aspectos econômicos e sociais.

“Tanto os homens quanto as mulheres exercem atividades na esfera da produção e da reprodução, no âmbito público e privado, em instituições governamentais ou comunitárias. Entretanto, as atividades domésticas e familiares são sempre responsabilidade das mulheres. O resultado dessa divisão é uma sobrecarga de trabalho na vida das mulheres, com um dia de trabalho mais longo que os homens”, explica.

Edna Calabrez salienta que continua na pauta de reivindicações do movimento feminista e de mulheres a luta pela construção da cidadania plena entre os gêneros e pela efetivação dos direitos iguais. “A conjuntura política e econômica nos trouxe desafios que impactam nesse debate e contribuem para a lentidão de mudanças e novas situações de exploração/opressões como o avanço dos mercados globalizados e do ultra neoliberalismo que incide no papel do estado no desenvolvimento de políticas sociais”.

A representante do Fórum de Mulheres defende que, estrategicamente, é preciso continuar fortalecendo a luta e as pessoas, desenvolvendo valores emancipatórios para a construção de uma cultura solidária eliminando as diversas diferenças e responsabilidades que se colocam para as mulheres, principalmente para as negras, transexuais e travestis, indígenas e camponesas.

E Vanda de Souza Vieira, coordenadora de Organização do Movimento Negro Unificado (MNU), acrescenta que no mercado de trabalho as mulheres negras ocupam majoritariamente as funções mais precarizadas como ocupações informais, trabalho doméstico, e setor de serviços. “Isso impacta nos salários, nas condições de trabalho e no assédio. Muitos assediadores consideram que essas mulheres que estão sob seu comando suportarão o assédio por necessidade ou por medo de que não acreditem na sua denúncia. E o que falar do feminicídio? Mesmo com a lei, nada é capaz de parar esses machistas que tem o apoio de setores e pessoas na sociedade”, explicou.

MNU

O MNU tem desenvolvido diversas lutas para que os direitos das mulheres sejam respeitados e mantidos. Isso é feito por meio da atuação em conselhos, congressos, integrando diretorias sindicais, entre outras iniciativas. Ganha destaque a campanha permanente pelo fim da pobreza menstrual (Todo Mês Sangra) que angaria fundos para a compra de absorventes.

Além disso, várias militantes do MNU atuam em entidades de mulheres em seus bairros: Thaíla Alexandra e Mariana, no Coletivo Mirante, no Romão e Forte São João (Vitória); Fátima Tolentino, no Probem, em Taquara II (Serra); Ilona Açucena, do Cine Tereza de Benguela, no bairro São Gabriel (Cariacica); Janildes Inácio, no Projeto Ubuntu, em Jacaraípe (Serra); Olindina Serafim na luta quilombola, no território do Sapê do Norte; e Marilene Pereira, integrante do Coletivo Afoxé e idealizadora dos Projetos “Somos todas Terezas” e “Festa das Ciatas”, que resgata a importância das mulheres negras no samba; entre outras.

A Adufes e o Andes Nacional têm a luta contra o machismo, a misoginia, o patriarcado, e outras diversas formas de opressão, como pauta de sua política sindical.

Adufes