Na noite de segunda-feira (23), primeiro dia do 36º Congresso do ANDES-SN em Cuiabá (MT), foi realizada uma palestra com representantes duas entidades parceiras do Sindicato Nacional. Maria Lúcia Fatorelli, da Auditoria Cidadã da Dívida, e Guilherme Boulos, do Casarão da Luta do Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST), falaram aos delegados e observadores presentes sobre as atividades desenvolvidas por suas entidades, que contam com apoio financeiro do ANDES-SN.
Maria Lúcia Fatorelli iniciou sua intervenção agradecendo o Sindicato Nacional pelas doações, que, segundo ela, ajudam a manter uma equipe de trabalhadores contratados pela Auditoria Cidadã da Dívida, que já conta com vinte núcleos espalhados pelo Brasil. Em seguida, Fatorelli explicou brevemente as análises da entidade sobre o sistema da dívida.
“O Brasil vive um grande paradoxo. Somos a nona economia mundial, com abundância de diversos recursos, mas, ainda assim, vivemos um cenário de escassez. Como um gigante desses entra em crise?”, questionou, criticando a alternativa sempre apresentada pelos governos de plantão, o ajuste fiscal.
“O problema é nosso modelo econômico concentrador de renda e riqueza. São bases desse modelo, que é desenhado propositalmente, a política monetária suicida, o sistema tributário regressivo e o sistema da dívida. Quem formula essa política, oficialmente, desde 1983, é o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial”, critica Maria Lúcia.
A coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida explicou que a política monetária suicida é baseada em juros elevados, restrição da base monetária, swap cambial e transferência de recursos públicos para o setor financeiro. Já o sistema tributário regressivo faz com que, mesmo havendo uma carga média de impostos de 36% no país, trabalhadores que ganham até dois salários mínimos cheguem a pagar 59% do que recebem em impostos. Essa maneira de tributação contribui para que 0,5% da população ativa concentre 43% da riqueza declarada no país.
“Por fim, o sistema da dívida é a utilização do endividamento público às avessas. Eles chamam de dívida pública a subtração de recursos públicos pelos mecanismos financeiros, sem qualquer contrapartida para o Estado”, completou Maria Lúcia Fatorelli, lembrando que o sistema da dívida está no centro de políticas como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 55, a Reforma da Previdência e a Reforma Trabalhista.
Casarão da Luta
Guilherme Boulos apresentou brevemente a história do Casarão da Luta, espaço de formação política do MTST em Taboão da Serra, Região Metropolitana de São Paulo. “É um espaço físico fundamental para o movimento. Era uma grande casa de um prefeito da cidade, em um terreno de 70 mil m², que, depois de um conjunto de ocupações e de uma marcha que caminhou 20 km até o palácio do governo paulista, conseguimos desapropriar”, disse. No mesmo terreno, o MTST construiu, por meio do Minha Casa Minha Vida Entidades, o condomínio João Cândido.
“O Casarão da Luta é um espaço de assembleia, de formação continuada. Essencial para qualificar luta politica por moradia”, completou Boulos, que também fez uma análise sobre a questão urbana e de moradia no país. “A crise urbana precedeu a econômica. A última década foi das empreiteiras, que ganharam a rodo. Muito do que ganharam, investiram em terra, gerando surto de especulação imobiliária. As cidades se transformaram em maquinas de criar sem teto”, criticou.
Guilherme Boulos encerrou ressaltando que a parceria do MTST com o ANDES-SN não se restringe ao Casarão da Luta, e que haverá muitos desafios a serem enfrentados de maneira conjunta entre as entidades em 2017. “Estamos vivendo um período de agravamento do conflito social, com o colapso dos serviços públicos. A Reforma da Previdência é um dos mais duros dos ataques, e o MTST a combaterá. Podem contar conosco para a luta em defesa da educação pública, e estaremos juntos nas lutas desse ano, também, como estivemos no final do ano passado contra a PEC 55”, concluiu.
A Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF) do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que inicialmente também participaria da palestra não pode enviar um representante ao Congresso.
As entidades
A Auditoria Cidadã da Dívida foi criada em 2000, após a realização do Plebiscito Popular da Dívida Externa. A organização foca suas ações na denúncia da política de geração e manutenção da dívida pública, que consome, anualmente, quase metade do orçamento brasileiro, desviando recursos que poderiam ser utilizados para a ,garantia de direitos sociais. A Auditoria Cidadã da Dívida também contribuiu com processos de auditoria das dívidas de países como Equador e Grécia, além de ter assessorado a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Dívida Pública em 2009 e 2010.
O Casarão da Luta é um espaço do MTST em Taboão da Serra, também região metropolitana da capital paulista. Fruto da desapropriação de uma casa ociosa, o Casarão tem como objetivo a consolidação de um espaço nacional de formação para trabalhadores sem teto, com biblioteca, videoteca, alojamento, sala de reuniões, brinquedoteca e creche. Ao lado do Casarão está localizado o Condomínio João Cândido, construído pelo próprio MTST por meio do programa Minha Casa, Minha Vida Entidades.