Manifestantes deixam as ruas e ocupam a Assembleia

Mais de 100 manifestantes ocupam o gabinete do presidente da Casa e só prometem sair após votação de projeto que extingue contrato da Rodosol, obstruído por Gildevan.

A rotina dos protestos que têm tomado as ruas de Vitória nas últimas duas semanas foi diferente nesta terça-feira (2). Os manifestantes resolveram trocar as ruas pela Assembleia Legislativa. Neste momento (10h30), um grupo mais de 100 pessoas permanece no gabinete do presidente da Casa, deputado Theodorico Ferraço (DEM). 

Eles só prometem sair quando os deputados votarem o projeto de decreto legislativo de autoria do deputado Euclério Sampaio (PDT), que propõe o rompimento do contrato do governo do Estado com a Rodosol e consequentemente o fim da cobrança do pedágio na Terceira Ponte. 

A votação foi interrompida pelo relator do projeto na Comissão de Justiça, deputado Gildevan Fernandes (PV), que pediu vista. Com a manobra, o deputado ganha três sessões para apresentar parecer antes de o projeto retornar à votação, o que só deverá ocorrer na próxima semana. 

Mas antes da ocupação do gabinete de Ferraço, muito coisa aconteceu. Cerca de 400 pessoas tomavam as galerias e dependências da Casa para acompanhar a histórica sessão. A primeira que levou o clamor das ruas das últimas semanas para dentro do legislativo. 

Desde as 15 horas, quando teve início a sessão, as galerias mais lembravam uma arquibancada e o plenário um campo de futebol. Os manifestantes acompanhavam lance a lance os movimentos dos deputados, que se mostravam desconfortáveis sob olhares tão atentos. Ninguém queria “pisar na bola” e receber as vais da galera, que não estavam ali para ver deputado furando ou batendo de canela na pauta.

Para os manifestantes, “pisar na bola” era se manifestar contra ou simplesmente se omitir sobre o projeto de Euclério. Dos 25 deputados presentes que se manifestaram, se ouviu e se viu de tudo. É verdade que alguns deputados, como se diz no jargão futebolístico, não entraram em campo, pois simplesmente não tocaram na bola ou fugiram dela. 

O deputado Hércules Silveira (PMDB) começou a falar sob vaias. Antes que os apupos crescessem, o peemedebista encurtou a conversa e foi logo dizendo logo que estava com Euclério. 

De outro lado, quem estava mais preparado para “derby” entre governo e a voz das ruas deitou e rolou. Fez jogadas de efeito e saiu para o abraço. Foi o caso do deputado José Esmeraldo (de saída do PR), que fez questão de registrar que foi o primeiro a apoiar o projeto do colega pedetista. 

Ele ainda apresentou números para provar que a Terceira Ponte já está muito bem paga e que a cobrança do pedágio não se justifica. Nas contas de Esmeraldo, nos 25 anos de concessão (mais 10 que tem pela frente), a concessionária pode arrecadar cerca de 1,2 bilhão, valor suficiente, segundo o parlamentar, para construir dez pontes e, de quebra, a rodovia que liga Vitória a Guarapari (ES-060). 

Os cinco deputados que compõem a bancada do PT fizeram de tudo para aparecer bem na foto. Já que decidiram, pela primeira vez num momento delicado para o governador Renato Casagrande, abandonar o barco e votar contra o governo. 

A orientação de Brasília para dar ouvido à voz das ruas parece que já ecoa por aqui. Depois da popularidade da presidente Dilma cair, o PT capixaba não quis ficar contra a voz das ruas, e se manifestou em bloco a favor do projeto de Euclério. Até a clássica bandeira do PT, que estava meio sumida das manifestações, tremulava nas galerias. 

Gilsinho Lopes (PR), que vem puxando bandeiras identificadas com os movimentos das ruas, deu seus pontapés e fez uma média com as galerias, que reconheceu o trabalho do deputado. Além de endossar o projeto do colega do PDT, Gilsinho lembrou ainda da CPI do Pó Preto, que foi enterrada pela Casa, e da CPI do Posto Fantasma, que, como a obra de Mimoso do Sul, não chegou nem a sair do papel. 

Mas a tarde era mesmo de Euclério. Afinal, é dele a proposta que originou a sessão histórica na Assembleia nesta terça-feira. O deputado estava tão à vontade com o povo, que posou para a fotografia exibindo a camiseta que pedia o fim da cobrança do pedágio. 

Quando os ânimos nas galerias se exaltaram e os manifestantes começaram a bater no vidro com mais energia, Euclério pediu calma e foi prontamente atendido. Para a inveja de alguns colegas, o pedetista mostrou intimidade para reger a massa, como fazem os ídolos das quatro linhas quando jogam os braços para cima pedindo mais apoio da torcida. 

A liderança do deputado, no entanto, não impediu os excessos da polícia. A exemplo do que tem acontecido nas ruas, a polícia usou força desnecessária e spray de pimenta para tentar controlar os manifestantes. Num certo momento, a PM chegou a encurralar as pessoas. Quem acompanhava o protesto disse que se houvesse um corre-corre muita gente seria esmagada ou pisoteada por culpa da ação desastrada da polícia.

Mas o espetáculo, que tinha tudo para acabar com a vitória das ruas com os manifestantes soltando o grito entalado na garganta, teve um desfecho melancólico. Gildevan fez o papel de carrasco nesta tarde histórica. Pediu vista do Projeto de Decreto Legislativo (PDL) 69/2013 e adiou a comemoração das galerias. 

Após um contorno infeliz, no qual tentou convencer os manifestantes de que, na juventude, também tinha se envolvido com os movimentos estudantis, Gildevan, na condição de membro da Comissão de Justiça, pediu mais tempo para analisar o assunto. Na verdade, aceitou fazer o serviço encomendado pelo governo, que temia a aprovação do PDL, que não precisa ser submetido à Executivo, logo, não poderia ser vetado.

Sobrou para o governo escalar um deputado disposto a marcar um gol contra o clamor das ruas. Mas o jogo ainda não acabou. 

Neste momento (20h30), o grupo de manifestantes continua ocupando o gabinete da Assembleia. O clima é calmo. A PM acompanha tudo de perto. A ex-deputada estadual Brice Bragatto (Psol) esteve no local e pediu a polícia que preserve a integridade física dos manifestantes, evitando confrontos. 

A informação é de que a PM permanecerá na Assembleia monitorando os manifestantes, mas não irá intervir. O grupo se mantém disposto a virar a noite no gabinete de Ferraço. A próxima sessão da Assembleia é na manhã desta quarta (3).

Fonte: Século Diário