Nota pública da Associação dos Docentes da Ufes sobre a situação política atual

A Associação de Docentes da Ufes (Adufes), ciente de seu papel como instituição de articulação e resistência política, vem a público manifestar repúdio à tentativa de impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, que se configura como Golpe de Estado, orquestrado por forças conservadoras contrárias aos interesses das classes trabalhadoras. Mantendo sua postura de independência em relação às disputas políticas de natureza partidária, mas ratificando sua história de crítica e de resistência contra toda forma de ataque aos direitos dos trabalhadores brasileiros, a Adufes denuncia o caráter inequivocamente ilegítimo da tentativa de impedimento de uma presidenta eleita pelo voto popular contra a qual não há comprovado, até o momento, crime de responsabilidade imputável.

Entendemos que a tentativa de impeachment em curso recalcitra contra todos os princípios do processo democrático e da ordem constitucional brasileira, estabelecendo-se a partir de práticas de exceção, tal como evidenciou o próprio Presidente Interino Michel Temer, quando afirmou recentemente que se trata de um julgamento político e não jurídico – condição que fere os preceitos constitucionais por não se ater a matéria jurídica e a dados comprovados, o que, sem dúvidas, abre precedente para uma grande insegurança política e jurídica quanto aos cargos políticos no Brasil.

A Adufes repudia igualmente todas as consequências desse processo espúrio de tomada do poder pelas forças conservadoras, que, sob a alegação de ajuste fiscal, contra o qual já lutávamos no Governo Dilma e que ora se apresenta de forma muito mais agressiva, avança sobre direitos fundamentais em quase todas as searas da construção da cidadania (trabalho, moradia, educação, saúde, soberania nacional em relação à matriz energética etc.). Dentre essas medidas, destacaremos aquelas que, da perspectiva da Educação, da Universidade, do Serviço Público e do Trabalho, expressam o  ataque direto a conquistas históricas e o grande retrocesso que já se afigura, mas que deve se agravar rapidamente, caso o processo de impeachment e a instalação desse poder ilegítimo tenham êxito.

Repudiamos veementemente a extinção do Ministério de Ciência e Tecnologia; a extinção do Ministério das Mulheres e da Igualdade Racial; as declarações do Ministro interino da Saúde que sinalizam na direção do desmonte do Sistema Único de Saúde, com a defesa da expansão dos planos de saúde em lugar de um sistema público disponível a todos os cidadãos; os problemas indicados pela lógica que subjazeu à anexação do Ministério da Cultura ao Ministério da Educação, posteriormente desfeita; a tentativa de proibição do debate e da resistência política em espaços públicos e em espaços institucionalizados; o desmonte do Conselho Nacional de Educação; a interrupção do Plano Nacional de Educação; o esvaziamento do Fórum Nacional de Educação, instância que abriga ampla representação, além de possibilitar a interlocução entre a sociedade civil e o governo; a lógica que vem pautando a defesa e a construção de uma Base Curricular que desconsidera as discussões, práticas e pesquisas historicamente articuladas no campo da Educação; a criminalização dos trabalhadores da Educação por meio de iniciativas como “Escola Livre” ou “Escola Sem Partido”; a suspensão de concursos públicos e contratações pelos próximos anos e a vinculação das progressões dos servidores à disponibilidade orçamentária (sem uma auditoria pública da dívida da União); o fim do programa Ciências sem Fronteiras para a graduação e a suspensão ou corte de bolsas de Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado, entre outros cortes orçamentários na esfera educacional, da educação infantil à pós-graduação.

Nós repudiamos também todas as medidas que vêm sendo cogitadas e anunciadas, muitas através de Projetos de Lei e Projetos de Emenda Constitucional em tramitação, como parte do pacote de retrocessos para os trabalhadores e para o país, de modo geral: aumento da jornada de trabalho; terceirização do trabalho; fim da estabilidade do servidor público; reforma do sistema de previdência/aposentadoria, aumentando o tempo de contribuição; a entrega da operação nos campos do petróleo a empresas estrangeiras e a anulação da exclusividade da Petrobrás na exploração do pré-sal; o cancelamento de investimentos na educação e na saúde oriundos do Fundo Nacional do Pré-Sal; e, por fim, os rumores relativos ao fim da universidade pública.

Repudiamos, por fim, os contornos dessa coalizão de forças que age em prol do impeachment, envolvendo setores da economia, do judiciário, da mídia e da política,  que, tentando desacreditar e deslegitimar as lutas dos partidos de esquerda, em suas variadas tendências, desfere golpe contra nosso Estado Democrático de Direito, violando a constituição e a democracia brasileiras, cuja defesa hoje se torna um dever dos estudantes, intelectuais, pesquisadores, professores e técnicos das universidades brasileiras. 

Fonte: Adufes