Coletivo de Mães faz abaixo-assinado contra ensino remoto na Ufes

O documento foi protocolado no Ministério Público Federal e em diversas pró-reitorias, centros e núcleos da universidade. 

Embora nenhuma instância superior da Ufes tenha aprovado formalmente a adesão ao ensino remoto, a condução da discussão por parte da Administração Central tem sido feita como se a decisão já tivesse sido tomada institucionalmente.

No Plano de Contingência da Universidade constam as diretrizes para a implantação do modelo de Ensino-Aprendizagem Remoto Temporário e Emergencial (Earte) para as/os estudantes de graduação e de pós-graduação. O coletivo Mães Eficientes Somos Nós critica a proposta por entender que o ensino remoto compromete o acesso e a permanência de estudantes na universidade pública, sobretudo daqueles com deficiências. O movimento reivindica que o semestre letivo seja repensado para o período pós-pandemia, com garantia de real participação da comunidade acadêmica na elaboração das alternativas.

Na avaliação do coletivo, que denuncia o Plano de Contingência em nota de repúdio e abaixo-assinado, a Ufes desconsidera as especificidades das/os estudantes com deficiências. Lucia Mara Martins, mãe de dois estudantes com autismo da Universidade, alerta que os filhos não têm condições de acompanhar as aulas da graduação de forma remota. “O que nós queremos é o fortalecimento de vínculo entre a família e a Ufes, mas não como cobrança de aula remota”, diz.

Coordenadora do coletivo, Lucia destaca que ao longo da história as pessoas com deficiências foram alijadas do espaço universitário mesmo que este seja garantido por lei. O artigo Art. 27 do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146.2015) afirma que todas as pessoas com deficiência devem ter assegurado o direito à educação, em todos os níveis de aprendizado, inclusive no Ensino Superior. No entanto, de acordo com o INEP (2016), no ano de 2016 havia 8.027.297 matrículas em cursos de graduação presenciais e à distância, 1.952.145 em instituições públicas e 6.075.152 em privadas. Desses mais de 8 milhões de estudantes, somente 0,47% do total de acadêmicos têm alguma deficiência.

“Acessar e permanecer na universidade pública é um desafio marcado por muita resistência e luta diária. Por isso, é preciso garantir condições psicopedagógicas e materiais para que esses estudantes concluam o curso de forma digna”, salienta, lembrando que o ensino remoto vai contribuir de forma massiva para a evasão na universidade, uma vez que a precariedade da interação resultará em queda sensível tanto na qualidade das aulas, quanto no aproveitamento por parte dos estudantes.

Por isso, o coletivo Mães Eficientes Somos Nós solicita em nota e abaixo-assinado protocolado junto ao Ministério Público Federal e à Ufes, que a instituição desconsidere esse tipo de modalidade de ensino tanto na graduação quanto na pós-graduação.

O documento assinado por várias entidades ligadas direta e indiretamente à educação pública reforça, uma vez mais, que a adesão às aulas remotas durante a pandemia implica diversos prejuízos psicossociais para as/os estudantes e que, portanto, alternativas precisam ser definidas junto das famílias e comunidade acadêmica.

Dificuldades. São muitas as limitações e dificuldades impostas pelo ensino remoto, que vão desde acesso à tecnologia e material didático adaptado para cada tipo de deficiência, às circunstâncias domésticas de cada pessoa. Segundo Lucia Mara, se antes da pandemia já era difícil manter as/os estudantes na universidade, o modelo virtual poderá agravar ainda mais a situação.

As mães e pais de alunos com deficiências frisam que é preciso garantir metodologias e técnicas pedagógicas diferenciadas que não estão contempladas nas formas não presenciais de ensino. O coletivo Mães Eficientes Somos Nós cita ainda o aumento da ansiedade e da depressão entre este grupo de discentes e familiares. “Esses processos já são comuns com deficientes intelectuais e transtornos do espectro autista, mas neste contexto de isolamento além de intensificados são muitas das vezes acompanhados de crises e surtos. E toda responsabilidade recai sobre a família, pois está cada vez mais limitado atendimento de saúde”.

Adoção do ensino remoto. Após discussão nas Câmaras Locais de Graduação (nos centros de ensino da Ufes), a Câmara Central de Graduação aprovou nessa segunda-feira, 27, uma proposta de resolução a ser encaminhada ao Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) sobre a retomada das atividades de ensino. O documento recomenda a criação de um período letivo especial, adotando-se o Earte, com início em 1º de setembro e duração de 15 semanas.

Segundo o cronograma aprovado pelos conselhos Universitário (CUn) e de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe), em reunião conjunta realizada no dia 14 de julho, a aprovação das resoluções que tratam da oferta de ensino, de pesquisa e de extensão durante a pandemia deverá ocorrer até o dia 6 de agosto.

Os conselhos Universitário (CUn) e de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe), em reunião conjunta realizada no dia 14/7, aprovaram um cronograma que prevê a definição de normas visando à aprovação de resoluções que tratam da oferta de ensino, de pesquisa e de extensão nas diferentes fases da pandemia. A aprovação das resoluções deve ocorrer até o dia 6 de agosto. Uma análise destes documentos foi publicada pela Adufes em vídeo. Assista abaixo.

Entretanto, a agenda aprovada tem prazo exíguo e em plenas férias, uma vez que o calendário acadêmico foi mantido e a Instrução Normativa nº 28 do Ministério da Economia impossibilitou alterações e cancelamentos das férias. Assim, as propostas que chegarão aos conselhos superiores carecem da real expressão da comunidade acadêmica sobre o tema.

“A Ufes, ao insistir em efetivar o Earte ocupará um papel de algoz fazendo com que pessoas com deficiências sejam expulsas, ainda que de forma velada, do espaço universitário, favorecendo uma lógica, individualista e meritocrática acirrando ainda mais as desigualdades e exclusão”, salienta nota de repúdio e abaixo-assinado. O documento ainda reforça que ao adotar esse modelo de ensino, a Ufes está indo na contramão da pluralidade defendida historicamente pela instituição de ensino na sociedade capixaba.

Fonte: Adufes