Plenária rechaça proposta de fragmentação da Ufes

Comunidade acadêmica deliberou por dar continuidade à pressão junto à bancada capixaba no Congresso Nacional contra o fatiamento da universidade.

O repúdio à fragmentação da Ufes contida nos projetos de lei que tramitam na Câmara Federal foi destacado durante a plenária promovida pela Adufes, pelo Sintufes e pelo DCE. A Administração Central esteve representada pelo vice-reitor, Roney Pignaton. Também participou da plenária virtual o deputado federal Helder Salomão (PT). O deputado Da Vitória (PDT) foi representado por um assessor e Neucimar Fraga (PSD), autor de uma das propostas e que havia confirmado presença, não compareceu.

A plenária ocorreu na última sexta (5) e foi transmitida ao vivo pelo Facebook da Adufes.

Os senadores Rose de Freitas (MDB), Marco do Val (Podemos) e Fabiano Contarato (Rede) também foram convidados, mas não compareceram. Contarato foi o único que justificou, uma vez que no horário da plenária, estaria em trânsito para a 26ª Conferência das Nações Unidas para a Mudança Climática (COP-26).

Evair de Melo (PP), que também é autor de uma das propostas de fragmentação, afirmou que não poderia comparecer em virtude de “compromissos já assumidos anteriormente”. Entretanto, a Adufes questionou se ele poderia enviar um representante, mas não obteve resposta.

Os dois projetos de lei tratam do desmembramento da Ufes para criação de uma nova universidade a partir do Centro de Ciências Agrárias e Engenharias (CCAE) e do Centro de Ciências Exatas, Naturais e da Saúde (CCENS), localizados no sul do estado. Os deputados Neucimar Fraga (PSD), autor do PL nº 1963/2021, e Evair de Melo (PP), autor do PL nº 2048/2021, apresentaram as propostas sem nenhum diálogo com a comunidade universitária.

A plenária foi conduzida pela presidenta da Adufes, Ana Carolina Galvão, que na abertura do evento exibiu o episódio de Alegre da websérie “Adufes nos Centros, onde a Ufes é feita”.

Em seguida, Ana convidou o diretor do Sintufes, Wellington Pereira, para fazer uso da palavra. Na avaliação dele, o que se pretende é enfraquecer a educação pública, pois se a intenção fosse criar uma nova universidade, outros espaços seriam buscados. “A fragmentação da educação pública encontra terreno fértil nesse governo”, disse.

O presidente do DCE, Hilquias Crispim também criticou a proposta e lembrou que os projetos de lei não preveem nenhum investimento na universidade. “Precisamos reforçar a unidade em defesa da nossa Ufes”, enfatizou Hilquias.

A vice-presidenta da Adufes e professora do Departamento de Medicina Veterinária em Alegre, Aline Bregonci, questionou: “a quem interessa a fragmentação da Ufes?”. Aline destaca que é o empresariado que se fortalece com o enfraquecimento das instituições públicas. “Esse governo só retirou recursos da universidade, não fez investimentos”, salientou, reforçando ainda que tudo isso ocorre ao mesmo tempo em que tramita a PEC 32, que, se aprovada, acabará com o serviço público. Ela lembrou que pejorativamente, chamaram os centros de Alegre de puxadinho. “Nós não somos puxadinho, nós pertencemos à Ufes”.

Os representantes do CCAE e do CCENS também expuseram indignação quanto à proposta de fragmentação da universidade e reafirmaram nunca terem sido consultados sobre o assunto. Representando o CCAE, o professor do Departamento de Zootecnia, Gercílio Alves de Almeida Júnior, fez críticas aos projetos de lei e demostrou perplexidade com os “argumentos insustentáveis” utilizados para justificar os projetos de fragmentação da Ufes. Na sua avaliação, estão criando demandas inexistentes, pois hoje não está faltando vaga para os estudantes de Alegre. Ele também destacou que não há como fazer um desmembramento sem impacto financeiro e sem ajustes na estrutura do campus.

O professor do Departamento de Biologia do CCENS, Gláucio Cunha, representante do CCENS na plenária, foi outro que se manifestou contrário ao fatiamento da Ufes. “A proposta do jeito que está sendo feita não gerará incrementos na economia, como os deputados vêm falando”. Ele mencionou ainda os problemas estruturais e a necessidade de investimento nos centros de Alegre.

O vice-reitor Roney Pignaton informou a posição do Conselho Universitário, que já se manifestou contrário à fragmentação. Apesar disso, o vice-reitor assinalou que acha “natural que a sociedade se sinta entusiasmada com a possibilidade de fragmentação, pois o anúncio de uma nova universidade é atrativo”. O vice-reitor acha positivo que a abertura de novos cursos e investimentos atraia o setor privado.

Esse é o argumento que está sendo largamente reforçado pelos meios de comunicação sem, no entanto, informar a população que a fragmentação faz parte de um projeto político de desmonte da educação pública.

Reposição orçamentária. Ana Claudia Meira, também professora do campus de Alegre, reafirmou em sua fala que o sul do estado tem universidade e é a Ufes. “São 17 cursos de graduação, 9 programas de mestrado e 3 programas de doutorado” assinalou. A professora informou que os centros de Alegre representam 12% da universidade e são responsáveis por 28% das pesquisas financiadas pela Ufes; e a universidade está presente no sul há 52 anos. “Portanto, não dá para criar algo que já existe”.

Segundo a professora, os centros têm dificuldades em funcionar, pois há deficiência nas condições de trabalho e recursos humanos, que devem ser resolvidos pela Ufes e não pela criação de algo que vai precarizar ainda mais. Ela ressaltou que ainda assim, o campus sul conta com 84 projetos de extensão e foi a única instituição em Alegre que durante a pandemia saiu às ruas para levar álcool, máscaras e ensinar sobre higiene na periferia. “Portanto, senhores deputados, se vocês querem mesmo melhorar a educação para o interior e para a população o que precisamos é da recomposição dos orçamentos das universidades do Brasil, o que inclui a Ufes, e não de políticas eleitoreiras”.

Pesquisa. Os estudantes Ricardo Sodré e Mateus Weller apresentaram o resultado de um questionário aplicado nos campi de Alegre e de Vitória. Dos 708 entrevistados, entre professores, estudantes e técnico-administrativos, 97,2% são contra a divisão da Ufes e apenas 2,8% a favor. “A comunidade acadêmica não está a favor dessa proposta. O que a Ufes precisa é investimento”, afirmou Weller.

Manifestação dos deputados. O deputado federal Helder Salomão (PT) participou da plenária e destacou que esse debate deveria ter precedido a apresentação de qualquer projeto envolvendo a universidade. “O sul do Espírito Santo já tem uma universidade, que é a Ufes. A gente só cria o que não existe. Essa proposta fere a autonomia da nossa Universidade. Esse projeto que não pode ir à frente”, frisou, colocando-se à disposição para abrir o diálogo na Câmara Federal.

Da Vitória (PDT), coordenador da bancada capixaba na Câmara Federal, foi representado por um assessor, que afirmou que as considerações feitas pela comunidade acadêmica serão encaminhadas ao parlamentar. Disse ainda que o mandato se preocupa com a questão de criação de novos cursos, planejamento e orçamento.

“É tempo de ir à luta”. A secretária geral da Adufes, Junia Zaidan, ressaltou que a discussão não é técnica, mas sim, política. “O problema não é o fato de o projeto ter sido elaborado sem diálogo ou não conter detalhamentos sobre a infraestrutura. Trata-se de um projeto que está inserido em uma agenda política. Se, por acaso, ele tivesse esses detalhes e tivesse sido discutido com a comunidade acadêmica, nem por isso deixaria de ser uma proposta vinculada a uma agenda de terra arrasada neste país’’, criticou.

Junia reforçou que não é apenas a forma como o projeto tem sido encaminhado que deve nos causar indignação, mas a proposta em si. “Ela tem que ser objeto do nosso rechaço e repúdio”. Disse ainda não estar chocada com a ausência dos proponentes dos projetos, pois tal posicionamento é consistente com a agenda de interesses privatistas. “Que fique marcado na memória de lutas desta universidade que temos construído a duras penas, no momento mais adverso da história, que estamos nos propondo a elevar o tom, e não a fazer uma política de resistência, de achar que é natural a política de fragmentação da universidade”, finalizou Junia, convocando para ir à luta contra essa proposta e insistindo ainda que, “quem defende a política de desmembramento como suposta ampliação de acesso ao ensino superior ou está mal informado ou está mentindo”.

Adufes