Roda de conversa reúne mulheres negras e reafirma a potência do caminhar juntas

Na noite de quinta-feira, 28 de julho, a Adufes foi tomada por variadas e emocionantes histórias de mulheres negras de diversas áreas. Em comum, todas evocaram a força da ancestralidade que as guiam e a potência de caminharem juntas. Confira no final da matéria a galeria de fotos.

A roda de conversa com o tema “Mulheres Negras: Histórias que nos Negaram” foi realizada pelo sindicato em sua sede, no campus Goiabeiras da Ufes. O evento, que aconteceu em alusão ao 25 de julho, Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha, reuniu professoras, estudantes, técnicas-administrativas, lideranças políticas, de movimentos populares e organizações sociais.

De acordo com Jacyara Silva, vice-presidenta da Adufes, a roda foi um momento muito importante de afeto e troca de saberes. “A nossa roda foi uma gira de construção de conhecimentos que emocionou a todas, todos e todes presentes. Foi uma roda preta cheia de axé e ancestralidade”, enfatizou a diretora.

A emoção tomou conta da roda logo no início da conversa com a apresentação de Elaine Vieira cantando “A Carne”, música que denuncia o racismo brasileiro e ganhou notoriedade na voz de Elza Soares. Em seguida foi a vez de Cláudia Almeida, a Poeta Negra Luz, emocionar a todes com seus versos, “peço licença a nossas ancestrais. Elas e a poesia nos fortalecem, nos dão energia para seguir”.

Espaços de poder

Vanda Vieira, coordenadora do MNU/ES, e Fátima Tolentino, atual presidenta da CEPIR, iniciaram a roda de conversa e em suas falas destacaram a importância de mulheres negras ocuparem os diversos espaços de poder. “Ocupar os espaços de elaboração das políticas é fundamental pra desenvolver projetos voltados pra garantir direitos pra nossa comunidade”, afirmou Vanda.

Segundo Fátima Tolentino, geralmente as políticas públicas pensadas para a população preta são sempre numa perspectiva de oferecer apenas um mínimo. “Eles fazem políticas pensando a gente como seres humanos inferiores e querem nos dar só o mínimo. Ocupar os espaços de decisão, ter o poder da caneta, é importante porque sabemos da nossa história, da grandeza do nosso povo e vamos pensar políticas públicas condizentes com o nosso legado ancestral”, explicou.

A estudante de Ciências Sociais, Kary Lopes e a vereadora de Vitória, Camila Valadão, destacaram que além do desafio para as mulheres negras ocuparem espaços de poder como a universidade e a política, elas ainda enfrentam a dificuldade para permanecer nesses espaços.

“Os obstáculos na vida de uma mulher negra são muitos. Começam lá na creche, quando nos negam vagas. No ensino fundamental, quando somos obrigadas a largar os estudos para trabalhar, cuidar sozinhas dos filhos, da casa. E mesmo quando a gente consegue chegar até aqui, nos negam permanência. Bolsas cortadas, auxílios atrasados”, denuncia a estudante.

Para a vereadora de Vitória Camila Valadão, ocupar a política institucional é um grande desafio para as mulheres negras em virtude de um sistema político que é racista e patriarcal. “O desafio é enorme para chegar. A violência contra nós é imensa. Muitas de nós são ameaçadas constantemente e estão adoecidas, inclusive. Mas eu acredito que ao chegarmos temos a tarefa de ressignificar esses espaços, subvertendo essa lógica, acionando a nossa ancestralidade contra essa máquina de moer gente e fazendo uma política do afeto, que fale com a gente, que nos acolha, nos fortaleça”, ressaltou a parlamentar.

Silenciamento

Rita Lima, docente aposentada do CCS, falou sobre o silenciamento resultante do racismo na academia que, segundo ela, é ainda maior no Centro de Ciências da Saúde (CCS). “O CCS é um lugar de silenciamento, é um lugar onde a pessoa preta tem que lutar muito pra se fazer representar, pra se fazer presente. E esses lugares não podem permanecer como ainda estão”, denunciou a professora, que entrou na universidade em 1977, ainda sob o regime militar.

A professora Maria Helena Elpídio, do Centro de Ciências Jurídicas e Econômicas (CCJE), fechou a roda salientando que quando as mulheres negras conseguem ocupar esses espaços, elas não entram sozinhas. “Esse movimento da Adufes está agregando mulheres que estão hoje na universidade, mas que vêm de diferentes espaços, como periferias, movimentos sociais. São histórias de vida e de muitas mulheres que lutaram pra que nós estivéssemos aqui. E estando aqui, a gente traz os nossos movimentos e se ampara neles também. A academia hoje é um espaço de resistência e, com a chegada de tantas de nós, tem sido espaço de criar uma outra forma e perspectiva de conhecimento e de universidade. Chegamos e trazemos uma outra possibilidade de futuro”, explicou a docente que lembrou no evento seus 16 anos de universidade.

Emoção

Além das falas de tantas mulheres potentes, as apresentações artísticas, que costuraram todo o evento, emocionaram as pessoas do início ao fim, e deram uma demonstração de um fazer política de forma diferenciada, enaltecendo a riqueza e diversidade da cultura negra.

Além da cantora Elaine Vieira e da Poeta Negra Luz, marcaram presença também as performances da estudante de Educação do Campo, Natália Pereira, integrante do MST/MG, com a poesia de Elisa Lucinda; e do Sarau Vozes Negras, com Ury Vieira e Jeffa Santana.

O evento foi organizado pela diretoria da Adufes em articulação com o GTPCGEDS, cujo calendário de ações foi discutido durante o 40º Congresso do Andes-SN, no início de 2022, em Porto Alegre-RS, e aprovado no 65º Conad, realizado na cidade de Vitória da Conquista, na Bahia, em julho.

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