Está em construção pelo Governo Bolsonaro um projeto que transforma as federais em universidades digitais, é o Reuni Digital, que massifica e desumaniza as relações docente-discente e baixa a qualidade do ensino. E para discutir o assunto, a Adufes promoveu o debate “Financeirização do ensino superior e Reuni Digital nas universidades públicas”, com o pesquisador Allan Kenji (Unicamp) e com a professora Priscila Chaves, do Centro de Educação da Ufes.
Foram dois debates, um no Ceunes, em São Mateus, no dia 05 de outubro e outro, em Vitória, no dia 06 de outubro. No evento que ocorreu no campus da região Norte, também houve o lançamento do livro impresso “A invenção da balbúrdia: dossiê sobre as intervenções de Bolsonaro nas Instituições Federais de Ensino Superior”, com a participação da reitora eleita e não nomeada da Ufes, Ethel Maciel.
No debate realizado na sede do sindicato, o pesquisador Allan Kenji, que analisa a expansão da oligopolização do ensino superior no Brasil, demonstrou que o Reuni Digital é a sucessão de políticas públicas ao longo dos anos, e que está no rol da “financeirização da educação”. Aponta que: “independente de qual seja o governo, a política de Estado é a privatização da educação superior”.
“Com as suas diferenças, vários dos governos que nós tivemos nas últimas décadas, construíram uma sucessão de políticas que agora têm como a cereja do bolo o Reuni Digital. Pode ter esse nome. Pode ter outro nome, mas a política segue em curso. É a mesma política que se revela nos cortes do orçamento. É a mesma política que vai expandir a universidade cortando recursos dela”, pontuou Kenji em sua fala.
O pesquisador da Unicamp analisou políticas como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos (Prouni), apresentando dados e informações cruciais sobre esses projetos, como a transferências de fundos públicos para as empresas privadas. Entre os dados apresentados pelo pesquisador, ele apontou que 77% das matrículas no ensino superior hoje estão na iniciativa privada e 23% nas públicas.
Em sua fala, Kenji explicou os motivos por trás de projetos como o Reuni Digital, e de hibridização da educação, como, por exemplo, as discussões de 40% da carga horária dos currículos ofertadas de forma a distância, que inclusive está sendo pautada na Ufes (a discussão na instituição ocorre sem a participação dos estudantes, em fóruns reduzidos e, portanto, que não possibilitam a efetiva participação da comunidade universitária).
“O que os capitais (as empresas privadas) perceberam já no início dos anos 2000, e está escrito nos documentos deles: enquanto as instituições públicas forem muito diferentes das privadas, existe uma barreira para a expansão do ensino superior privado no Brasil. É preciso quebrar a coluna dorsal das carreiras nas instituições públicas, é preciso vencer o sindicalismo e o movimento estudantil dessas instituições, é preciso fazer com que o ensino das instituições públicas, se a gente não puder fechar essas instituições, não puder baixar um decreto extinguindo as universidades federais e estaduais, é preciso que elas sejam indiferenciadas em relação ao ensino que é oferecido pelos capitais. Eles precisam que a gente faça a adesão aos 40%, ao ensino híbrido, ao Reuni Digital, porque eles precisam que a gente legitime o ensino a distância, o ensino híbrido, porque eles precisam que a gente não se pareça nada diferente do ensino precário que eles querem oferecer para a nossa classe (trabalhadora)”, destaca.
Ele também observa que as empresas privadas têm um diagnóstico muito preciso sobre as expectativas da sociedade brasileiras em relação às universidades. “A sociedade brasileira reconhece as universidades públicas como instituições de qualidade, como as instituições as quais os trabalhadores gostariam de ver seus filhos matriculados. Quando a sociedade brasileira responde qual o tipo de instituição que ela gostaria que o seu filho estudasse, são as instituições públicas no ensino presencial”, afirma.
Já está entre nós
O Reuni Digital, ou o Plano de Expansão da EaD nas Instituições de Ensino Superior Públicas, foi enviado pelo Ministério da Educação em maio deste ano às Instituições Federais de Ensino Superior (IFES). Em tese, a proposta visa cumprir a Meta 12 do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024, que prevê que 40% das matrículas em educação superior sejam em instituições públicas. Atingir esse percentual só seria possível com o ensino a distância, seja parcial ou total.
A professora Priscilla Chaves (CE) explicou como está sendo pensando o Reuni Digital, e quais os argumentos o governo tem usado para a implementação desse projeto, que já está em teste em 10 instituições de ensino superior. Entre as propostas estão a contratação de tutores e não doutores, como ocorre hoje, a implementação de currículos didático-pedagógico criados por equipes multidisciplinares, bem como ambientes virtuais de integração entre instituições de ensino, desterritorializando as/os estudantes do seu contexto regional, entre outras. E a precarização e o barateamento da educação.
A Adufes elaborou um panfleto com os principais ataques do Reuni Digital à Educação. Clique aqui e confira.
A docente do Centro de Educação ponderou em sua fala que esse projeto já está circulando na universidade, e ela exemplifica nos seguintes pontos: mais de 70% dos e-mails institucionais e plataformas (como o Google Meet) da educação pública estão nas mãos das Big Tech; a Portaria do MEC nº 2.117/2019, que dispõe sobre a carga horária dos cursos de graduação presenciais e prevê até 40% do currículo de forma a distância; a curricularização da extensão e a nova diretriz de formação das licenciaturas (Resolução nº 2/2019).
“A gente já está vivendo em um contexto de educação semipresencial”, pontuou.
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Confira fotos da atividade:
Fotos: Sérgio Cardoso.
Adufes