Conheça algumas das mulheres negras que se destacaram na luta pela igualdade racial e pelos direitos das mulheres no Brasil
Em homenagem à luta e à resistência das mulheres negras, o dia 25 de julho é celebrado como o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha. No Brasil, a data também celebra Tereza de Benguela, conhecida como “Rainha Tereza”, que viveu no século XVIII no Vale do Guaporé (MT) e liderou o Quilombo de Quariterê.
Segundo documentos da época, o lugar abrigava mais de 100 pessoas, incluindo indígenas. Sua liderança se destacou com a criação de uma espécie de Parlamento e de um sistema de proteção da população quilombola. Tereza foi morta após ser capturada por soldados. O Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra foi instituído no Brasil pela Lei 12.987/2014.
Já o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha foi instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU) e teve origem durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-Latino-Americanas e Afro-Caribenhas, realizado em Santo Domingo, na República Dominicana, em 1992. O evento reuniu mais de 300 representantes, de diversos países, para compartilhar suas vivências, denunciar as opressões e debater estratégias de luta e soluções contra o racismo e o machismo.
As datas, incluídas no calendário do ANDES-SN, trazem visibilidade à luta das mulheres negras em defesa de direitos e contra a opressão de gênero, a exploração e o racismo.
Conheça mais sobre algumas das mulheres negras que se destacaram na luta pela igualdade racial e pelos direitos das mulheres:
Xica Manicongo
Xica Manicongo viveu no século XVI e é reconhecida como a primeira travesti não indígena do Brasil. Ela foi escravizada, trazida ao país e vendida a um sapateiro em Salvador (BA). Xica foi processada pela Inquisição portuguesa sob a acusação de sodomia e por participar de “uma quadrilha de feiticeiros sodomitas”. Na realidade, ela foi criminalizada por sua identidade de gênero, refletindo uma trajetória que ainda persiste para a população trans e travesti no Brasil. Sua história simboliza a luta das travestis brasileiras pelo direito à memória e ao reconhecimento, na luta contra a opressão de gênero e sexualidade.
Dandara
Dandara dos Palmares foi uma guerreira e líder quilombola, que lutou contra a escravidão e pela liberdade de negras e negros, através de embates e estratégias de resistência para a libertação do povo escravizado no século XVII. Ela dominava técnicas da capoeira e lutava ao lado de homens e mulheres contra os diversos ataques ao Quilombo dos Palmares. Foi companheira de Zumbi dos Palmares, com quem teve três filhos. Com a invasão holandesa, os ataques ao território quilombola aumentaram, e Dandara foi presa. Em 1694, preferindo a morte à escravidão, ela se jogou de uma pedreira para não ser capturada pelos homens brancos escravocratas.
Tereza de Benguela
Tereza de Benguela, conhecida como “Rainha Tereza” (século XVIII), viveu no Vale do Guaporé (MT). Liderou o Quilombo de Quariterê após a morte de seu companheiro, José Piolho, assassinado por soldados. O quilombo abrigava mais de 100 pessoas, entre negras e indígenas, e resistiu da década de 1730 ao final do século. Sua liderança se destacou pela criação de uma espécie de Parlamento e de um sistema de defesa. Não há registros precisos sobre sua morte; uma das versões sugere que ela foi capturada e morta por soldados em 1770. O dia 25 de julho é, oficialmente no Brasil, o Dia Nacional de Tereza de Benguela e da Mulher Negra.
Esperança Garcia
Esperança Garcia, uma mulher escravizada, viveu no século XVIII no Piauí. Em 1770, ela escreveu uma carta denunciando as situações de violência que as pessoas escravizadas sofriam na fazenda de Algodões, a 300 quilômetros da futura capital, Teresina. O documento, endereçado ao então governador da província, foi posteriormente reconhecido como uma das primeiras petições jurídicas do Brasil, após a descoberta de uma cópia da carta nos arquivos públicos do Piauí. Esta carta é considerada um símbolo de resistência e ousadia na luta por direitos no contexto do Brasil escravocrata. Em 2022, a Ordem dos Advogados do Brasil reconheceu Esperança Garcia como a primeira advogada do país.
Luísa Mahin
Luísa Mahin, guerreira negra africana da Nação Nagô – Jeje, foi um símbolo de resistência contra a escravidão no século XIX. Ela comprou sua alforria em 1812 e foi uma das líderes e articuladoras da Revolta dos Malês, em 1835, e a Sabinada, em 1837. Quituteira de profissão, utilizava seu tabuleiro para distribuir mensagens em árabe. Ela sempre recusou o batismo e a doutrina cristã. Um de seus filhos, Luís Gama, tornou-se poeta e um dos maiores abolicionistas do Brasil. Após ser descoberta, Luísa fugiu para o Rio de Janeiro, onde foi encontrada, detida e possivelmente deportada para Angola, embora não existam documentos que comprovem essa informação.
Maria Felipa
Maria Felipa de Oliveira, que viveu no século XIX, foi uma heroína da resistência na luta pela Independência do Brasil, especialmente reconhecida por suas ações na ilha de Itaparica (BA). Escravizada liberta, Maria morava na ilha com outras mulheres e homens libertos. Viviam de catar mariscos, pescar e preparar pães e quitutes para vender em feiras locais e lojas próximas. Maria liderou um grupo de 200 pessoas, entre mulheres negras e indígenas, em emboscadas contra os portugueses, incendiando embarcações inimigas e defendendo a causa da liberdade. Sua coragem e liderança destacaram-na como uma figura fundamental na história da independência baiana.
Almerinda Farias Gama
Almerinda Farias Gama (1899-1999) foi uma advogada, jornalista, sindicalista, tradutora e ativista feminista, pioneira na luta pelos direitos das mulheres e pela igualdade racial. Integrante da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, ela desempenhou, ao lado de outras mulheres, um papel crucial na conquista do direito ao voto feminino no Brasil. Gama foi uma das primeiras mulheres negras a atuar na política do início do século XX. Ela fundou o Sindicato dos Datilógrafos e Taquígrafos do Distrito Federal e, como representante desse Sindicato, foi a única mulher a participar como delegada classista na Assembleia Nacional Constituinte de 1933. Atuou até a promulgação da Constituição, em outubro de 1934.
Antonieta de Barros
Antonieta de Barros teve um papel fundamental na história brasileira. Nascida em 1901, a jornalista e política brasileira foi a primeira mulher negra eleita deputada estadual no Brasil, em 1934. Pioneira na luta pela educação e no combate à discriminação racial e de gênero, criou o Curso Particular Antonieta de Barros, voltado para a alfabetização de adultos. Sua trajetória foi marcada pela defesa da educação como ferramenta de emancipação e cidadania. É conhecida por lutar pelos seus ideais em um contexto onde as mulheres não tinham direito de opinar. Antonieta de Barros morreu no dia 18 de março de 1952, aos 50 anos de idade.
Laudelina de Campos
Nascida em 1904 e neta de escravizados, Laudelina de Campos Melo abandonou a escola aos 12 anos, após a morte de seu pai em um acidente de trabalho, passando a cuidar de seus cinco irmãos mais novos. Aos 16 anos, foi eleita presidenta do Clube 13 de Maio, que promovia atividades recreativas para a população negra de sua cidade. Ela teve uma atuação marcada em movimentos populares e políticos e, em 1936, ajudou a fundar a Associação das Empregadas Domésticas, em Santos (SP). Além de lutar pelos direitos das empregadas domésticas, ela se envolveu no movimento negro e participou de diversos grupos culturais. Laudelina faleceu em 1991, em Campinas (SP).
Carolina de Jesus
Carolina Maria de Jesus (1914 – 1977) foi uma grande escritora brasileira e trabalhou como catadora de materiais recicláveis. Ela guardava revistas e cadernos que achava no lixo e reuniu em casa mais de 20 cadernos com relatos sobre o cotidiano da favela. Um deles deu origem ao seu livro mais famoso “Quarto de Despejo: Diário de uma Favelada”. Carolina tornou-se um ícone de resistência e perseverança, sendo uma das primeiras escritoras negras a alcançar reconhecimento internacional. Carolina revelou, através de sua escrita, a importância do testemunho como meio de denúncia da desigualdade social e do preconceito racial.
Lélia Gonzalez
Filha de um ferroviário negro e de uma empregada doméstica indígena, Lélia Gonzalez nasceu em 1934 e se destacou como intelectual, antropóloga e ativista brasileira na luta pelos direitos das mulheres negras e pela igualdade racial. Professora universitária, foi uma das fundadoras do Movimento Negro Unificado (MNU) e do Coletivo de Mulheres Negras N’Zinga. Suas obras e ações tiveram um impacto significativo no combate ao racismo e ao sexismo no Brasil. Falecida em 1994, com boa parte de sua obra esgotada, Lélia foi esquecida por alguns anos, mas passa, agora, por um processo de recuperação de seu legado e obra. Lélia é lembrada como uma voz potente na defesa da identidade e da cultura afro-brasileira.
Marielle Franco
Marielle Franco nasceu em 1979 e foi uma política brasileira que representou uma série de minorias ao longo da sua vida política. Negra, mulher, mãe, feminista, pobre, criada na favela e LGBTI+, Marielle foi eleita vereadora da Câmara do Rio de Janeiro e, também, presidenta da Comissão da Mulher da Câmara. Ela concluiu o mestrado em Administração Pública, pela UFF, com uma dissertação intitulada “UPP: a redução da favela a três letras”. No dia 14 de março de 2018, Marielle Franco foi assassinada em um atentado contra o carro em que estava com o seu motorista, Anderson Gomes. Quem a mandou matar não imaginava que ela era semente e que seguiria inspirando milhões de pessoas ao redor do mundo.
Conceição Evaristo
Conceição Evaristo, nascida em 1946, é escritora e ensaísta brasileira, reconhecida por sua literatura engajada que aborda questões de raça, gênero e classe. Para conciliar os estudos, trabalhou como empregada doméstica. Autora de obras como “Ponciá Vicêncio” e “Becos da Memória”, Evaristo dá voz às experiências e vivências das mulheres negras brasileiras. Seu trabalho literário tem sido fundamental para o reconhecimento da literatura afro-brasileira no cenário nacional e até internacional, com livros traduzidos em outros idiomas. Recebeu vários prêmios entre eles, o Jabuti, o mais importante da literatura nacional, na categoria Contos e Crônicas pelo livro Olhos d’água. Este ano, foi eleita imortal na Academia Mineira de Letras, sendo a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na AML. Evaristo também tem aberto espaços para que outras mulheres negras se destaquem no mundo literário.
*Com informações de Fundação Palmares, Agência Senado, Ministério da Igualdade Racial, Instituto Esperança Garcia e FGV.
Andes-SN