Adufes recebe Carla Akotirene e grande público em evento antirracista que tratou de Interseccionalidade, resistência e caminhos coletivos

Teorias feministas foram construídas para mulheres brancas, promovendo a invisibilização das mulheres negras. Um dos efeitos disso é que mulheres negras morrem mais como vítimas de violência no Brasil, o que chama a atenção para o fato de que a categoria de gênero ocidental não dá conta da questão no país

A Adufes recebeu em sua sede nesta quarta-feira, 4, o evento “Confluências Negras – Interseccionalidade e violências: sobre resistências e caminhos coletivos de cuidado”, com a presença de Carla Akotirene, que esteve pela primeira vez em Vitória. Ela é doutora em Estudos Feministas pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) e consultora em políticas públicas. O encontro foi realizado pela Adufes e contou com a parceria do Instituto Raízes e do Movimento Negro Unificado do Espírito Santo (MNU-ES).

Na abertura do evento, cujo público lotou a sede do sindicato, a cantora e compositora Livia de Paula fez uma apresentação musical e as/os representantes dos realizadores foram chamados à mesa. Jocelino Junior, do Instituto Raízes, Ana Raquel do MNU-ES, e Jacyara Paiva, vice-presidenta da Adufes, fizeram breves falas ressaltando a importância do evento para a mobilização da juventude negra e o resgate da ancestralidade, saudando as/os presentes.

Akotirene

A fala da palestrante da noite, Carol Akotirene, teve como um dos focos o feminismo negro, lembrando que houve apagamento histórico das mulheres negras em uma lógica da construção de uma mulher universal a partir das mulheres brancas não racializadas. Isso fez com que as teorias feministas tenham sido construídas para as brancas, promovendo a invisibilização das mulheres negras. Um dos efeitos disso é o fato de as mulheres negras morrerem mais como vítimas de violência no Brasil, o que chama a atenção para o fato de que a categoria de gênero ocidental não dá conta da questão no país.

Carol Akotirene trabalha com o conceito de Interseccionalidade e o aplicou ao que se convencionou chamar de “Guerra às Drogas”. Homens negros são as maiores vítimas dessa política de estado que valoriza mais a escrita do que a palavra, alimentando o racismo estrutural e institucional por meio de perseguições e flagrantes forjados. Ela lembra que, em uma audiência de custódia eles têm mais valor para o juiz do que a palavra de mulheres – mães, irmãs e companheiras – e do próprio acusado, que afirmam ser uma inverdade, algo plantado, pois se trata de um trabalhador. Os veículos de imprensa também pouco querem ouvir dessas mulheres porque dialogam com a escrita e sua lógica racista.

Akotirene tem trabalhado em seus estudos com as audiências de custódia e frisou que a perseguição direcionada aos homens negros neste contexto tem rebatimento nas mulheres negras que por sua vez sofrem violência doméstica por serem mulheres e não querem/podem confiar nas autoridades que já perseguem os homens de sua comunidade. Nessa trama, outros diversos fatores relacionados à identidade – como território, sexualidade, faixa etária, entre outros – se somam, azeitando as opressões sofridas por elas.

Durante o evento, a professora Jacyara Paiva, vice-presidenta da Adufes, ressaltou que presenciar a Adufes lotada de pessoas negras para o evento faz com que ela tenha a certeza de que tudo valeu a pena, lembrando que é preciso que estas pessoas estejam por toda a Universidade e que para isso é necessário que a Ufes reconheça sua condição de instituição racista, com apartheid em seus espaços de poder, para que ela possa avançar em direção à construção de uma Universidade de fato antirracista. E, ao dar boas-vindas, Junia Zaidan, presidenta da Adufes, mencionou a luta unificada que cabe a todas/os. “Nosso compromisso com a luta antirracista e nossa condição comum de classe trabalhadora são dois elos entre nós que gostaria de reforçar hoje”, destacou.

Manisfesto

Na abertura do evento, houve também a leitura, feita em conjunto pelas presidenta da Adufes, Junia Zaidan e a vice Jacyara Paiva, de um manifesto repudiando o racismo e reafirmando a posição do Sindicato de não tolerar atos e falas racistas e nem qualquer outra forma de opressão na Universidade e, em especial, nas dependências da Adufes. O manifesto é uma resposta a um recente caso em que professoras/es brancas/os proferiram falas racistas dentro da sala de café da sede da entidade sindical. A Adufes está adotando medidas contra esse episódio e para prevenir ações futuras da mesma natureza.

Sobre Carla Akotirene

Carla Akotirene é doutora em Estudos Feministas pela Universidade Federal da Bahia (Ufba) e consultora em políticas públicas.  Além disso, é autora dos livros “O que é interseccionalidade?”, pela Coleção Feminismos Plurais,  coordenada por Djamila Ribeiro, e “Ó Paí Prezada! Racismo e sexismo tomando bonde nas penitenciárias femininas de Salvador”, ambos publicados pela Editora Jandaíra. É também idealizadora da Opará Saberes, primeiro curso de extensão voltado à capacitação de candidaturas negras ao mestrado e doutorado em universidades públicas. Atualmente, Carla concentra estudos sobre feminismo negro, racismo estrutural e equidade de gênero e interseccionalidades.

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