A única seção sindical da greve das federais que enfrenta investidas judiciais do Ministério Público Federal (MPF), da Justiça Federal e da Defensoria Pública da União (DPU) juntos é a Adufes, revelando a tentativa de criminalização não apenas da greve, mas de toda a categoria docente
A Adufes participou nesta quarta-feira, 29 de maio, do Debate “A Defesa da Educação Pública e a Greve nas Federais”, realizado no Plenário Rui Barbosa, na Assembleia Legislativa do Espírito Santo (Ales). O evento aconteceu como uma Reunião Extraordinária da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos da Ales que teve como sua proponente a deputada estadual Camila Valadão (Psol-ES). O vereador de Vitória, André Moreira (Psol-ES) participou como convidado.
Além de parlamentares, compuseram a mesa de debate a presidenta da Adufes, Ana Carolina Galvão; a vice-presidenta da Adufes, Jeffa Santana; a diretora do Andes-SN Jacyara Paiva (Regional Leste); e a representante do Comando Local de Greve (CLG) Docente na Ufes, Patrícia Santos.
“A quem interessa criminalizar o conjunto das/dos professoras/es da Ufes?”. Essa pergunta deu o tom de todo o debate que teve o microfone aberto para que qualquer pessoa presente pudesse falar, além de cobertura e transmissão ao vivo da TV Assembleia.
A presidenta da Adufes, Ana Carolina Galvão, lembrou que a única seção sindical da greve das federais que está enfrentando investidas judiciais do Ministério Público Federal (MPF) e da Defensoria Pública da União (DPU) é a Adufes, demonstrando o alto nível de conservadorismo do Espírito Santo e o desejo de setores que querem deliberadamente criminalizar não apenas o movimento, mas a categoria como um todo.
“A quem interessa criminalizar docentes da Ufes? Se não é uma novidade a perseguição política a sindicatos, movimentos sociais e partidos de esquerda, certamente uma das diferenças a que estamos assistindo nesse momento é o uso de expedientes jurídicos e de comunicação que vimos no governo passado. Divergências transformadas em denuncismo; disputa de narrativas com distorções dos fatos; uso de aplicativos de mensagens para disseminar o ódio à greve; normalização das atividades usando a máquina pública para lançar editais, cobrar prazos, convocar reuniões e intimidar grevistas; o uso de instrumentos jurídicos para coação; ataques machistas, misóginos, transfóbicos e capacitistas; ameaças pessoais – veladas ou explícitas; e até mesmo a agressão física”, disse a presidenta.
Legitimidade
No âmbito federal, Ana Carolina lembrou que a democracia fica fragilizada um pouco mais a cada dia, quando as negociações deixam de ser feitas com as legítimas entidades que representam as categorias e sem encerrar as negociações, como fez a Secretaria de Relações do Trabalho depois do último encontro com o Andes-SN e o Sinasefe. As entidades reivindicaram a continuidade da mesa de negociação e a resposta da Diretoria de Relações do Trabalho no Serviço Público foi que “apesar de informadas que o espaço para apresentação de novas propostas orçamentárias está esgotado, as entidades insistiram na marcação de uma data para reunião. Nesse sentido, fica agendada reunião para dia 3 de junho, quando reafirmaremos a proposta apresentada”. Para a presidenta da Adufes, democracia pressupõe diálogo e não a intransigência explicitada no modo como o governo tem operado.
A representante do Comando Local de Greve (CLG) Patrícia Santos explicou que o governo Lula segue inflexível na sua proposta de reajuste zero para 2024, tanto para docentes em exercício quanto para aposentadas/os. Outras categorias foram contempladas com reajustes já a partir de 2024, como Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Penal Federal, com índices acima de 20% já neste ano.
“Além disso, com a proposta apresentada para 2025 e 2026, 80% da categoria docente teria recomposição muito abaixo dos 22,71% reivindicados. A pauta do Revogaço de medidas de Bolsonaro e Temer e, especialmente, a da recomposição orçamentária das instituições de ensino, têm sido negligenciadas pelo governo. No dia 27 de maio, representantes do MGI não só mantiveram um posicionamento autoritário, mas também se reuniram com o Proifes, entidade sem carta sindical que assinou um Termo de acordo às escondidas, sem apoio nem mesmo das suas bases. Ficou explícito que a Educação não é uma política prioritária para este governo”, disse Patrícia.
Universidade transformadora
A vice-presidenta da Adufes, Jeffa Santana, lembrou de sua história com a universidade e de como sua entrada na Ufes foi importante para toda a sua família composta por trabalhadoras/es negras/os, e que fizeram imensos sacrifícios para que ela estivesse ali. E frisou que foi na Universidade que pode vivenciar sua travestilidade e trilhar o processo que faz dela quem ela é hoje.
Jeffa defendeu, emocionada, que outras muitas pessoas possam ter acesso ao ambiente transformador que a universidade pode e deve oferecer a todes, mas lembrando que para isso é preciso que haja uma recomposição do orçamento que possibilite que esse ambiente siga exercendo seu papel de transformação social e com a estrutura necessária para desenvolver suas atividades em benefício da sociedade. Por isso, ela afirmou que a greve continua até que haja uma proposta decente do Governo.
Extrema-direita
A diretora do Andes-SN, professora da Ufes Jacyara Paiva, lembrou que a educação pública e o serviço público como forma (em si) são indispensáveis no enfrentamento à extrema-direita. “A atitude do governo contra as/os grevistas fortalece as forças que são inimigas do serviço público e os grupos privatistas que querem terceirizar nossa força de trabalho, assim como o conservadorismo que ataca as universidades e escolas públicas desde o golpe contra Dilma. Isso ocorre por meio de projetos como o Escola sem Partido, além de acusações de que somos supostos parasitas, como declarou Paulo Guedes, ministro de Jair Bolsonaro. Essa atitude do governo amplia, justamente, as forças que nós, servidoras/es, nos empenhamos tanto para combater desde o golpe de 2016 e contra as quais, de forma pujante, lutamos na campanha eleitoral de 2022 que elegeu Lula presidente”.
Após ouvir as representantes do movimento grevista e as intervenções do público presente, a deputada estadual Camila Valadão lembrou que não há muita surpresa sobre o que seria o governo Lula 3, segundo ela, pior que as edições 1 e 2, em especial nas políticas de austeridade e restrições no orçamento.
A parlamentar explicou que, embora tenha sido feita uma grande mobilização para elegê-lo com a compreensão da gravidade enfrentada pelo Brasil até 2022 com o governo Bolsonaro, é preciso pressionar sim o governo federal. Ela refutou a ideia de que a mobilização da educação federal fortalece a extrema-direita e enfraquece o governo, defendendo a importância e a legitimidade do movimento para o cumprimento dos compromissos feitos durante as eleições. Camila lembrou, ainda, que, se há ministérios com resistência ao avanço do Capital sobre o fundo público e as políticas públicas, esse não é o caso do Ministério da Educação, hoje loteado por interesses de grupos empresariais.
O vereador André Moreira acrescentou que a luta das categorias em greve é necessária porque a outra opção é entregar todo o governo nas mãos do Centrão. Ele ressaltou que eleger Lula foi importante para derrotar um projeto que não apenas era inimigo das pautas sociais, mas que pregava a destruição de todas e todos que não estivessem alinhados. Ele também pontuou que, no capitalismo, nenhum governo é popular, estando todos eles a serviço dos poderosos, variando apenas o espaço para diálogo e negociações com a sociedade. Para o parlamentar, o movimento grevista fortalece o governo e não o contrário, uma vez que mostra a disposição de diversos setores para contrapor o avanço dos interesses do Capital sobre o estado brasileiro.
Ato
Antes do debate, às 12h30, foi realizado um ato na frente da sede do legislativo estadual com faixas sobre a Greve sendo exibidas nos sinais de trânsito e travessia de pedestres. Foi realizada, ainda, panfletagem com transeuntes e motoristas que passavam pela avenida Américo Buaiz, em Vitória.
O evento foi organizado a partir de uma orientação do Comando Nacional de Greve (CNG) para que os comandos locais procurassem parlamentares para apoio e realização de atividades. No Espírito Santo, o CLG acionou as/os deputadas/os estaduais Iriny Lopes (PT-ES), João Coser (PT-ES) e Camila Valadão (Psol-ES), além da vereadora Karla Coser (PT-ES) e do vereador André Moreira (Psol-ES). Contudo, apenas a deputada Camila Valadão e o vereador André Moreira deram retorno. A deputada Iriny Lopes teve sua ausência no debate justificada pela colega Camila Valadão.
Nos ofícios enviados às/aos parlamentares foi solicitada a realização de um evento sobre a greve docente federal e a construção de um ofício conjunto do Comando Local de Greve (CLG) com as/os parlamentares para envio à bancada capixaba em Brasília (deputados federais e senadores) solicitando atenção e apoio às pautas do movimento grevista. A presidenta da Adufes informou que o escopo do ofício conjunto será ampliado para todas/os as/os parlamentares dos Partidos que responderem à demanda. Camila Valadão também colocou a Assembleia Legislativa à disposição para pautar uma audiência pública para tratar da greve da educação.
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